MOSCA-BRANCA – SUPERPRAGA DA AGRICULTURA MUNDIAL AMEAÇA A BATATICULTURA BRASILEIRA

André Luiz Lourenção – andre@iac.br José Alberto Caram de Souza dias – jcaram@iac.br Cristina Gomes Quevedo Fugi – crisagro97@hotmail.com IAC – Instituto Agronômico de Campinas Centro de P & D Fitossanidade


INTRODUÇÃO
Os insetos denominados comumente de moscas-brancas, pertencem à família Aleyrodidae, ordem Hemiptera, e compreendem cerca de 1200 espécies conhecidas, estando a maioria delas distribuídas em regiões tropicais. De todas essas espécies, poucas são referidas como pragas importantes na agricultura, merecendo destaque a mosca-branca de casa de vegetação Trialeurodes vaporariorum e, principalmente, Bemisia tabaci. Descrita por Gennadius em 1889 como Aleyrodes tabaci com base em exemplares coletados em planta de fumo, na Grécia, a mosca-branca B. tabaci disseminou-se por todos os continentes, não sendo constatada sua presença apenas na Antarctica. Trata-se de inseto polífago, isto é, que se alimenta e também se cria em ampla gama de plantas, incluindo-se culturas de expressão econômica e plantas da vegetação espontânea. Sua disseminação por diferentes regiões geográficas é atribuída ao transporte de material vegetal pelo homem. No Brasil, sua presença é conhecida desde a década de 20, quando o pesquisador Gregório Bondar assinalou sua ocorrência em nosso país. A partir da década de 50, foi proposta a existência de raças ou biótipos em B. tabaci em virude da descoberta de que, populações morfologicamente idênticas, apresentavam características biológicas distintas, como diferenças na colonização de plantas e também na transmissão de vírus. No início dos anos 90, foi introduzido no Brasil, mais precisamente no Estado de São Paulo, o biótipo B de B. tabaci (= B. argentifolii Bellows & Perring). Em sequência, esse inseto rapidamente atingiu as principais fronteiras agrícolas do país, sendo poucos os estados onde ainda não ocorre. O biótipo B é mais
nocivo à agricultura que outros biótipos de B. tabaci porque, além de atuar como vetor de vírus, também causa danos diretos às plantas devido à alimentação (sucção de seiva e injeção de substâncias tóxicas), reduzindo o vigor da planta, induzindo anomalias fisiológicas, como a folha-prateada-da-aboboreira e o amadurecimento-irregular-dos-frutos- do-tomateiro, depositando grande quantidade de secreção açucarada que prejudica os processos fisiológicos da planta e favorece a ocorrência de fumagina.
Atualmente no Brasil, pode-se destacar a importância econômica de B. tabaci biótipo B, para as culturas do algodão, melão, melancia, abóboras, feijão, hortaliças, com destaque para o tomateiro, ornamentais e, mais recentemente, a batata. Dependendo da região, surtos populacionais têm ocorrido em soja, videira e maracujá, nesta última com transmissão de vírus.


BIOLOGIA
As moscas-brancas passam pelas fases de ovo, ninfa, com quatro fases, sendo a última conhecida como pupa e adulto. Para B. tabaci biótipo B, os ovos são depositados pelas fêmeas na face inferior das folhas e apresentam um pedicelo que o liga ao tecido foliar. A duração da fase de ovo pode variar de 6 até 15 dias, dependendo da temperatura.
Terminado esse período, a ninfa sai do ovo e caminha pela folha até selecionar um local adequado, onde introduz seu estilete para alimentação da seiva da planta, e aí permanece fixa até a emergência do adulto. A duração dessa fase é bastante variável, dependendo além da temperatura da planta hospedeira. Sob temperaturas ao redor de 25 o C, a fase de ninfa em plantas de tomate pode durar de 12 a 13 dias. Todavia, sob temperaturas mais baixas, essa fase e a de ovo tendem a se alongar.
Emergindo os adultos, o acasalamento se dará principalmente no período entre 12 horas e dois dias. Tanto as ninfas como os adultos se alimentam da seiva das plantas. A transmissão de vírus é realizada pelos adultos que, ao se alimentarem da seiva de uma planta infectada, tornam-se portadores do vírus ao passar para outra planta sadia, e nela se alimentando, transmitem esse agente infeccioso. No Brasil, são de grande importância econômica o vírus do mosaico-dourado-do-feijoeiro (Bean golden mosaic vírus – BGMV) e o geminivírus que vem infectando tomateiros, Tomato yellow vein streak vírus (TYVSV), ambos transmitidos por B. tabaci biótipo B.


OCORRÊNCIA EM BATATA
A ocorrência de mosca-branca em batata é conhecida há muitos anos, mas suas infestações não vinham causando grandes preocupações aos agricultores. Recentemente, após a introdução do biótipo B de B. tabaci, têm sido verificadas infestações mais severas desse inseto em lavouras de batata no estado de São Paulo, inclusive com transmissão de vírus. Em batata, a duração do ciclo de vida do inseto é semelhante à encontrada para outras culturas. Em teste conduzido sob condições ambientes, a fase de ovo durou de 6 a 8 dias e a fase ninfal ao redor de 11 dias.
Transmissão de vírus para a batata Em 1985, Julio Daniels (EMBRAPA – Clima Temperado) e colaboradores, relataram um surto de um tipo de mosaico com características de deformação das folhas, em plantações de batata no estado do Rio Grande do Sul. Esses pesquisadores associaram os sintomas com os de uma virose semelhante que ocorria em batatais na Argentina, denominada mosaico-deformante-da-batata.
Apesar de naquele país não se ter suspeitado, naquela ocasião de transmissão por mosca-branca, por volta de 1987-88, batata-semente da variedade Achat, plantada no estado de São Paulo, adquirida do Rio Grande do Sul, apresentou alta incidência do mosaico-deformante.
Identificações preliminares feitas por meios biológicos e moleculares pelos pesquisadores A. S. Costa e J. Veja (IAC-ex Seção de Virologia) indicaram a presença de geminivírus, sendo que a transmissão pela mosca-branca B. tabaci foi também confirmada. Avaliações de perdas causadas pelo mosaico-deformante, em plantas com infecção secundária, apontaram redução de 40% no peso da produção da variedade Achat.
Desde o final da década de 80 até o final da de 90, não se registrou nenhuma ocorrência do mosaico-defornante em batatais no Brasil, possivelmente pelo não-aproveitamento da batata-semente Achat oriunda do Rio Grande do Sul para os ciclos seguintes. Além disso, os lotes de batata-semente certificada estavam certamente livres dessa virose.
Em meados da década de 90, algumas plantações de tomate da região de Hortolândia e de Sumaré- SP, apresentavam alta incidência de uma virose até então desconhecida, caracterizada por riscas amarelas nas nervuras, bastante visível nas folhas apicais, principalmente das plantas jovens. Essas riscas tendem a se estender amarelecendo o limbo foliar a partir do pecíolo (foto1 – tomateiro).



TYVSV em tomateiro


A constante associação de plantações de tomate com batata dentro de uma mesma propriedade ou entre propriedades vizinhas, além da presença intensiva de mosca-branca ocorrendo de forma praticamente incontrolável em plantações da região de Sumaré, levaram a suspeita da presença de geminivírus, transmitido por mosca-branca, o que foi posteriormente comprovado com base em testes moleculares e inclusive por análise de sequência do DNA viral. Por se tratar de geminivirose distinta biológica (passa mecânicamente para plantas testes de Datura stramonium) e molecularmente das outras geminiviroses até então descritas em tomatais.
Essa nova virose ficou denominada Tomato yellow vein streak virus (TYVSV) (Farias et al, 1997), o que se traduz pela sintomatologia de risca amarela das nervuras do tomateiro, conforme denominada anteriormente (Souza-Dias et al, 1996). Testes de transmissão do TYVSV por B. tabaci para plantas jovens de batata de diversas variedades, reproduziram sintomas de mosaico-deformante, semelhantes àqueles verificados na década de 80, de origem do Rio Grande do Sul. Alguns anos mais tarde, Ãvila e colaboradores (Ãvila et al; 2000) através de análise de genoma viral, confirmaram ser o TYVSV o vírus causador do mosaico-deformante em plantas de batata oriundas do Rio Grande do Sul.



TYVSV em batata


A foto 2 mostra os sintomas de mosaico-deformante em planta da variedade Monalisa, a qual foi originada de tubérculo produzido por planta infectada em campo, revelando a perpetuação do TYVSV pela batata-semente.
As evidências do mosaico-deformante da batata, causadas pelo TYVSV, em plantações de batata intercaladas ou vizinhas aos tomatais, como se verifica historicamente na região de Sumaré, têm merecido constante alerta por parte dos produtores, pesquisadores e responsáveis técnicos da vigilância fitossanitária. Passou-se então a alertar aos problemas da continuidade da interação tomatal com batatal em regiões como a de Sumaré, onde surtos de mosca-branca têm demandado medidas de controle desse inseto não apenas como praga, mas também como vetor de viroses.
O encarecimento adicional para a cadeia produtiva da batata, resultante da tentativa de controle da mosca-branca não apenas como praga, mas também como inseto vetor do TYVSV, soma-se os prejuízos decorrentes das perdas na produção e degenerescência da batata-semente.


Métodos de controle
Resistência de plantas a insetos: Estudos de resistência de plantas de expressão econômica a B. tabaci tiveram grande impulso nos últimos anos, acompanhando a crescente importância desse inseto como praga e vetor de vírus em todo o mundo a partir dos anos 80. Em culturas em que o inseto age como transmissor de vírus, avaliações para seleção de germoplasma têm sido efetuadas, detectando-se linhagens com graus variáveis de resistência em tomateiro e em feijoeiro. Nestes casos, o ideal seria a introdução de fatores de resistência ao vírus, assim, em tomateiro, tem-se atualmente os híbridos ‘Densus’, ‘Ty-Fanny’ e ‘Scala’, resistentes a TYVSV e para feijoeiro, as cultivares IAPAR 72, tolerante a BGMV, IAC Carioca-Eté e IAC-Tybatã, com níveis moderados de resistência a esse vírus.
Para a batata, ainda não se têm informações acerca da existência de variedades resistentes a geminivírus. Para outras culturas, como abóboras, algodão, melão e soja, diferenças entre as cultivares com relação à colonização e danos do inseto têm sido encontradas, sendo que, para esta última, duas cultivares desenvolvidas pelo IAC, IAC-17 e IAC-19, apresentam resistência a B. tabaci biótipo B, podendo ser recomendadas para plantio em regiões e épocas em que o inseto constitui problema para essa e outras culturas, contribuindo para diminuir as populações do inseto.


Controle biológico:
diversos parasitóides e predadores podem utilizar B. tabaci como presa. Entre os parasitóides, destacam-se micro-himenópteros dos gêneros Encarsia e Eretmocerus, cujo emprego para controle de moscas-brancas em casa de vegetação e em outras formas de cultivo protegido encontra-se bem estabelecido, principalmente em países europeus. Entre os predadores, espécies pertencentes a diferentes ordens foram registradas predando B. tabaci biótipo B no Brasil; em condições de cultivo protegido, coccinelídeo do gênero Delphastus parecem ser, entre os insetos, os agentes de controle mais eficientes. Com relação a entomopatógenos, avanços têm ocorrido na seleção de isolados mais virulentos dos fungos Verticillium lecanii, Paecilomyces fumosoroseus e Beauveria bassiana, com ação sobre moscas-brancas.


Controle químico:
devido às características do inseto, tem sido o método mais empregado. Atualmente, os inseticidas com maior impacto no controle de B. tabaci são os neonicotinóides e os reguladores de crescimento (IGR). Na primeira categoria, incluem-se imidaclopride, acetamipride e tiametoxam, enquanto buprofezim, um inibidor da síntese de quitima, e piriproxifem, um análogo do hormônio juvenil, constitui-se IGRs. O modo de ação e os atributos bioquímicos tornam esses produtos, coletivamente muito eficientes no controle de B. tabaci. Todavia, seu uso intensivo em alguns sistemas de produção tem conduzido ao aparecimento de populações resistentes. O uso de extratos vegetais no controle de B. tabaci tem sido pesquisado, envolvendo avaliação de diversas partes vegetais (frutos, folhas, ramos e sementes) de diferentes espécies da família Meliaceae (Melia azedarach, Trichilia pallida e Azadirachta indica); os melhores resultados na mortalidade de ninfas foram obtidos com extratos de sementes de A. indica e de frutos de M. azedarch.


Práticas culturais:
em função de sua natureza preventiva, práticas culturais podem desempenhar papel importante no manejo de moscas-brancas em sistemas agrícolas. Assim, podem ser destacadas medidas como rotação de culturas, destruição de restos culturais, manejo de ervas daninhas, períodos livres de plantio, as quais mostram-se efetivas se usadas em escala regional, mas de difícil demonstração experimental. Outras práticas, como barreiras vivas, cultura-armadilha, estande mais denso, coberturas de solo com plásticos ou com outras substâncias refletivas ou ainda coberturas vivas, podem causar impacto sobre moscas-brancas, mas são mais difíceis de serem adotadas pelos produtores por requererem mudanças significativas nos sistemas convencionais de cultivo. Para as culturas que são afetadas por vírus transmitidos por B. tabaci e que são inicialmente produzidas em condições controladas para posterior transplante, como é o caso do tomate, as plântulas podem ser protegidas contra infestação de adultos por meio de estruturas, como túneis de malha fina, que permitem passagem de luz e de ar, mas que impedem a entrada de insetos como moscas-brancas.


Manejo integrado:
na década de 90, foram desenvolvidos no Arizona (EUA) programas de manejo para as culturas do algodão e do melão. Estabeleceram-se métodos de amostragem, níveis de ação e estágios para uso de diferentes grupos de inseticidas, começando-se com os IGR e deixando para o final os piretróides. Nessas condições, em que B. tabaci não atuava como vetor de vírus de importância para essas culturas, os níveis de ação eram relativamente altos em comparação com o de culturas como o tomateiro e o feijoeiro, em que a mosca-branca transmite com eficiência espécies de vírus extremamente nocivas, e que os níveis de ação estão próximos dos limites de detecção do inseto. No Brasil, o grande desafio é o desenvolvimento de programas de manejo de B. tabaci que possam ser implementados nos diferentes pólos agrícolas. Para isso, são necessários estudos da ecologia desse inseto nos sistemas de produção e em ambientes adjacentes, cujas informações servirão de base para táticas que visem evitar ao máximo a presença do inseto, incluindo práticas como manipulação do habitat, destruição de hospedeiros, tanto do inseto como de vírus, exclusão e formas estáveis de controle biológico. Além dessas medidas, que incluem  práticas culturais e controle biológico, devem ser levados em consideração o uso de cultivares resistentes (ao inseto e/ou ao vírus) e o controle químico, com enfoque especial ao manejo de resistência.


Literatura Pesquisada – Consulte o autor


TYVSV em tomateiro


TYVSV em batata

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