PRINCIPAIS DESAFIOS PARA O AGRONEGÓCIO BRASILEIRO DA BATATA.

Nirlene Junqueira Vilela1; Sieglinde Brune (1); Igor Origenes M. Borges (2)


(1) Pesquisadores da Embrapa Hortaliças; (2) Estagiário – Curso de Agronomia da FTB, Brasília-DF. C. P. 218, 70.259-970, Brasília-DF nirlene@cnph.embrapa.br


A produção mundial de batata, em 2004
atingiu o total de 328,866 milhões de toneladas
em uma área de 19,132 milhões de hectares.
No Brasil, a produção foi de 2,892 milhões de
toneladas em uma área de 138, 6 mil hectares.


O Brasil possui elevado potencial edafoclimático para o cultivo da batata, que, em geral, é produzida com alto nível tecnológico . Em 2004, a produtividade da batata brasileira (20.865 kg/ha) superou a produtividade média do mundo em 21,3% (FAO, 2005). Tradicionalmente, o principal paradigma da produção para qualquer cultura tem sido a elevação da produtividade por unidade de área. Contudo, mais recentemente, frente a acirrada competição imposta pelo processo de globalização dos mercados a ótima qualidade vem sendo principal critério de agregação de valor ao produto.


Um dos principais entraves do sistema produtivo é o baixo consumo da população que pode ser explicado principalmente por fatores econômicos (falta de renda da grande parte da população para adquirir o produto no mercado). Esta situação induz a retração da demanda de mercado e, consequentemente provoca desorganização no fluxo de comercialização que é agravada pelas entradas intempestivas do produto importado. Por outro lado, falhas por parte das políticas de abastecimento, associada a falta de exigência dos consumidores pela classificação da batata no mercado quanto às aptidões culinárias levam ao desconhecimento da qualidade intrínseca das cultivares, com consequente desvalorização do produto nacional.


Ao contrário dos outros grandes produtores mundiais de batata, onde as cultivares e sua finalidade culinária são identificados na comercialização, no Brasil, comercializam-se tão somente batata lisa e batata comum, classes que pouca relação possuem com a qualidade interna do tubérculo e com sua finalidade de uso. Essa é uma das razões para o limitado número de cultivares de importância no Brasil. Ainda, existe muito pouca informação a respeito da aptidão culinária dos tubérculos e, em consequência, sobre a qualidade final do produto após o processamento. Porém, os consumidores, cada dia mais atentos, exigem essas informações. Soma-se a isto a crescente utilização de batata processada no Brasil, especialmente as batatas fritas em fatias ou palitos, produzidas pela indústria e por estabelecimentos voltados à alimentação.


Nesses casos, a batata brasileira não se torna competitiva em relação ao produto processado importado, justamente porque não há informação sobre a finalidade de uso dos tubérculos. Os elevados custos de produção das lavouras confrontados com os baixos preços obtidos no mercado associados à falta de uma política específica para o setor tem produzido efeitos perversos para a bataticultura nacional.


A batata é uma cultura de elevada importância socioeconômica. Evidenciando os benefícios dessa hortaliça para a sociedade, além do valor como alimento substancialmente nutritivo, a cultura da batata é uma potente fonte de geração de emprego e renda tanto no setor agrícola como no demais setores do agronegócio. Embora tecnificada, a cultura da batata, em maior parte é praticada por pequenos produtores com modos de exploração típica de agricultura familiar. De acordo com o Censo Agropecuário de 1996, no Brasil são 98.487 produtores explorando a cultura da batata em maior parte (90%), concentrados nos extratos de áreas inferiores a 50 hectares, compreendendo a 1ª safra (91,4%), 2ª safra (91,1%) e 3ª safra (87,7%). No aspecto da produção, os estabelecimentos de áreas com menos de 50 hectares tiveram participação significante no total da produção na 1ª safra (50%), com maior concentração no Paraná (36,4%), Minas Gerais( 28,2%) e São Paulo (12,5%) e Rio Grande do Sul (11,3%). Na 2ª safra significante participação dos extratos de áreas menores de 50 hectares (42,6%), a produção concentrou-se em Minas Gerais (32,8%), Paraná (31,5%), Rio Grande do Sul (17,9%) e São Paulo (10%). Na 3ª safra, os pequenos produtores com áreas inferiores a 50 hectares responderam por um percentual de 36% do total, com maior concentração da produção em Minas Gerais (56,5%), São Paulo (29,3%) e Paraná (10,1%).


A maior parte dos pequenos produtores de batata e respectivos membros da família tem nesta cultura a única fonte de emprego e renda.


No âmbito da cadeia produtiva, a batata movimenta à montante os setores de máquinas, veículos e equipamentos agrícolas; corretivos de solos, sementes, fertilizantes, defensivos, embalagens e outros insumos necessários ao manejo da cultura e da infraestrutura de beneficiamento, transporte e comercialização, empresas terceirizadas de seleção e classificação de produtos, agroindústrias, o mercado financeiro. À jusante do setor produtivo, durante o ano inteiro, a batata participa de complexas logísticas dos mercados atacadistas e varejistas. Embora ainda não quantificado por estudos, as evidências confirmam que o número de empregos e o montante de renda gerado nesses segmentos do agronegócio de batata atingem proporções significantes. Estudos desenvolvidos pela SAASP (1997) ressaltam que só no setor de produção, cada hectare de batata pode gerar anualmente de 3 a 4 empregos diretos e o mesmo número de empregos indiretos. Com base nesta estimativa calcula-se que a área total cultivada com batata pode sustentar anualmente mais de 415 mil empregos diretos na agricultura, sem contar os empregos gerados nas outras atividades da economia relacionadas à produção e distribuição da batata. No aspecto do consumo, as pesquisas de orçamento familiar realizadas pelo IBGE (2005) registram o consumo anual de 5,271 kg/habitantes.


Entretanto, o IBGE levantou o consumo nos domicílios, porém ainda não estão disponíveis as informações sobre a quantidade de batatas que é destinada às agroindústrias para processamento e sobre a quantidade de produto processado utilizando matéria-prima nacional e matéria-prima importada. Em todos os lugares a batata pode ser vista como um componente constante dos cardápios de comida pronta dos restaurantes tanto populares como especiais, entretanto, parece que ainda não estão publicadas as informações sobre a quantidade de batata demandada pelo setor de refeições coletivas (redes de fastfoods, restaurantes industriais, hotéis, hospitais, merenda escolar). O consumo institucional ou o setor de refeições coletivas, vem crescendo no Brasil. De acordo com publicação do Ministério da Integração Nacional, o setor de refeições coletivas cresceu 34% entre os anos de 1998-2002 ( Saabor, 2003).


Aspectos de mercado.No mercado interno, considerando o movimento do mercado atacadista, a CEAGESP (maior mercado atacadista do País) comercializou um volume 3.993.689 sacos de 50 kg de batata beneficiada comum ao preço médio de R$ 0,62/kg. A maior quantidade 381.841 sacos foi comercializada no mês de dezembro e o preço mais baixo ocorreu no mês de janeiro ( R$ 0,42/kg). Esse tipo de batata alcançou o preço mais alto no mês de agosto (R$ 0,94).


Entretanto a menor quantidade foi ofertada em setembro (256.083 sc).Da variedade comum fora comercializados 292.355 sacos ao preço médio de R$ 0,59/kg. O movimento comercial da batata lisa em 2004 atingiu o total de 184.293 sc. ao preço médio de R$ 0,74/kg. As maiores ofertas ocorreram em setembro (29.478 sacos) e dezembro (24.368 sacos), atingindo o preço mais baixo em janeiro (R$ 0,49/kg).


No mercado internacional, o movimento da batata brasileira, nos últimos 10 anos vem apresentado significantes flutuações (Tabela 1) O processo de globalização dos mercados e a consolidação do Mercosul, em 1995, promoveram a reconversão da bataticultura nacional. Na busca de maior competitividade, os produtores passaram a investir intensivamente na atividade, sobretudo, na ótima qualidade da batata e na redução de custos. Nesse contexto, elevaram de forma significativa o nível tecnológico das lavouras e conduziram maior especialização da mão-deobra, ao ponto de tornar a cultura seletiva.
Neste aspecto, parte significante de produtores grandes e pequenos foram excluídos da atividade pelo mercado, por não apresentar eficiência do ponto de vista técnicoeconômica.




A cultura respondeu com ótima qualidade do produto, mas a falta de uma política agrícola setorial não foi capaz de estimular o crescimento das exportações, a remuneração adequada do alto capital investido pelos produtores brasileiros e a contenção da entrada de elevados volumes importados de utros países. Ainda mais grave são os desgastes da economia nacional, traduzidos pelos elevados deficits da balança comercial (tabela 1). Comparando os anos de 1994 e 2004 verifica-se que as importações relativamente reduziram-se muito pouco (45%), bastam pequenas valorizações do real em relação ao dólar americano, para que o mercado interno brasileiro seja entupido com a batata de outros países. Em compensação, de 1994 a 2004, importações arrastaram aproximadamente US$ 640.883 mil das divisas brasileiras.


Os maiores volumes de importações foram de batatas, preparadas, conservadas e congeladas (76,8%) seguido pelas batatas frescas (17,6%) e sementes (2,1%) (tabela 2). A grande quantidade de batata preparada congelada importada pelo Brasil poderia ser reduzida significativamente, se estivessem disponíveis para os consumidores as informações sobre as suas aptidões culinárias; Assim por exemplo, considerando as cultivares mais plantadas no Brasil, as qualidades culinárias são indicadas por: (**=recomendada) e (*=aptidão média). Para a Ãgata: cozimento**; Monalisa: fritura*, cozimento**; Asterix: fritura**, cozimento*; Mondial: fritura*, cozimento*; Atlantic: fritura**; Bintje; Fritura**, cozimento**. Dividindo-se a safra brasileira total de batata (2004) pela população de 2004, registrada pelo IBGE (182.957 mil habitantes) obtem-se a disponibilidade per capita da produção de 15,808 kg/por habitante. A elevada disponibilidade deste alimento para a população não foi fato importante o suficiente para barrar as importações em 2004 de 20.361 toneladas de batata fresca ao preço US$ 1.804 mil.


Em 2004, o custo médio da produção foi de R$ 13.666/ha (FNP, 2005). Considerando o valor do dólar médio em 2004 de R$ 2,9259 (BACEN, 2005), cada hectare cultivado com batata custou US$ 4.670/ha. Então, o montante gasto pelo Brasil com as importações de batata fresca, seria suficiente para financiar, adicionalmente, 386,3 hectares que estariam acrescentando à produção nacional mais 8.060 toneladas. Essa quantia gasta com importações, somada aos empregos diretos e indiretos que deixaram de ser criados no setor agrícola e nos demais setores da economia, constitui grande perda para o país, quando deveria ser vantajosamente investida no setor produtivo, na geração de cultivares com melhor produtividade e qualidades culinárias superiores, na infra estrutura de produção e comercialização e na melhoria do bem estar da população brasileira. Tudo isso só depende de uma boa política agrícola setorial que possa contribuir para melhorar os preços (maior rigidez na classificação de produtos)e que sustente os custos de produção, contribuindo para uma maior valorização do produto.


REFERÊNCIAS: CONSULTE AUTOR

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