Ãlcool combustível a partir da batata

1. Introdução
Desde os primeiros momentos da indústria automobilística, o álcool tem sido considerado como um combustível viável. De fato, o primeiro modelo desenvolvido por Henry Ford tinha seu motor adaptado para funcionar tanto com álcool como gasolina. Entretanto, como a gasolina tornou-se mais barata e disponível que o álcool, este combustível deixou de ser considerado prioridade até as crises econômica de 1929 e do petróleo dos anos 1970. Atualmente, a ênfase em redução da poluição e limitação do aquecimento global também têm sido fortes motivações para a continuidade de produção e uso deste combustível renovável.










Cristina Maria Monteiro Machado
cristina@cnph.embrapa.br
Embrapa Hortaliças
Rod. BR 060 km 09. Cx. P. 218
CEP 70359-970 Brasília – DF.
Frederique Rosa e Abreu
frederique@agricultura.gov.br
Coordenação Geral de Agroenergia,
Ministério da Agricultura Pecuária
e Abastecimento


 
Qualquer produto que contenha uma quantidade considerável de carboidratos (açúcares) constitui-se em matéria-prima para obtenção de álcool pela via fermentativa. Entretanto, para que seja viável economicamente, é preciso que se considere o seu volume de produção, rendimento industrial e o custo de fabricação. De acordo com o tipo de carboidratos presentes nas matérias- primas elas podem ser classificadas em três tipos descritos a seguir:


• Materiais açucarados: contêm açúcares simples, ou seja, carboidratos com seis (monossacarídeos) ou doze átomos de carbono (dissacarídeos), como glicose, frutose, e maltose. Ex.: cana-de-açúcar, beterraba açucareira, melaços, mel de abelhas e frutas;


• Materiais amiláceos: contêm carboidratos mais complexos como amido e inulina que podem ser quebrados em glicose pela hidrólise ácida ou ação de enzimas num processo denominado malteação ou sacarificação. Ex.: grãos amiláceos (milho, sorgo, cevada, trigo) raízes e tubérculos (batata, batata- doce, mandioca);


• Materiais celulósicos: São constituídos de celulose, e apesar de estarem disponíveis em grande quantidade, não oferecem por enquanto, condições econômicas na produção de etanol, pois para tornarem-se fermentescíveis devem passar por um processo complexo de hidrólise ácida. Ex.: palha, madeira, resíduos agrícolas e de fábricas de papel.


Embora no Brasil o uso de cana açúcar para produção de álcool seja muito bem sucedido, outras matérias primas podem ser consideradas futuramente, seja para possibilitar a produção em regiões sem vocação agrícola para aquela cultura, seja para inclusão de pequenos produtores usando materiais amiláceos como batata, mandioca e batata-doce, principalmente pelo aproveitamento das perdas resultantes da produção agrícola, tanto na colheita como na classificação final.


2. Processo de produção do álcool de batata


2.1 Preparo do substrato
Os materiais amiláceos podem ser divididos em amiláceos (grãos) e feculentos (raízes e tubérculos). A vantagem do uso dos últimos é que podem ser utilizados materiais refugo, fora de tamanho, machucados e até mesmo, com brotação desenvolvida. De fato, a existência de brotos reduzirão a quantidade de malte (ou enzimas) necessária para a malteação. As batatas contém entre 15 e 18% de material fermentescível, as batatas doces contém cerca de 22% de amido e 5-6% de açúcares redutores, e a mandioca contém 30-35% e todos estes materiais feculentos são uma fonte tradicional de álcool. Em média, 1 tonelada de batatas levam a uma produção de 85 a 95 litros de álcool.


Todos os materiais amiláceos requerem um processo de cozimento para diluição e gelatinização do amido e, em seguida, de sacarificação ou hidrólise no qual o amido é transformado em açúcares fermentescíveis. Esta hidrólise pode ser por maltagem, por adição de enzimas ou pela ação de ácidos.


2.2 Fermentação
A via fermentativa é o método utilizado na obtenção de etanol no Brasil e na maior parte dos países do mundo. Este processo é constituído de três partes: preparo do substrato, fermentação e destilação do fermentado. As leveduras são fungos normalmente unicelulares, apresentando células de forma arredondada. Apesar de não ser o único microrganismo capaz de produzir álcool, as propriedades específicas das leveduras, como tolerância a altas concentrações de álcool e gás carbônico, o crescimento rápido e a capacidade de fermentação as tornam os microrganismos mais adequados para a operação em escala industrial. As leveduras mais importantes para a produção de álcool são as Saccharomyces cerevisiae e Saccharomyces carlsbergensis. Sua biomassa pode ser recuperada como subproduto da fermentação e transformada em levedura seca, que se constitui em matériaprima para fabricação de ração animal ou suplemento vitamínico humano. Existem várias linhagens (raças) desse microrganismo, que foram selecionadas ao longo do tempo, para maior tolerância a variações de pH, maior resistência ao álcool e rendimento da fermentação.


Tudo o que é necessário para iniciar a fermentação é misturar o inóculo de leveduras e manter as condições adequadas para o seu crescimento e produção de etanol. O tempo de fermentação pode variar com a matéria-prima, o microrganismo, o pH, temperatura e diversos outros fatores, levando, normalmente, de dois a cinco dias. Diversos fatores físicos (temperatura, pressão osmótica), químicos (pH, oxigenação, nutrientes minerais e orgânicos, inibidores) e microbiológicos (espécie, linhagem e concentração da levedura, contaminação bacteriana), afetam o rendimento da fermentação, ou seja, a eficiência da conversão de açúcar em etanol.


2.3 Destilação
O mosto fermentado (vinho) que vem da fermentação possui, em sua composição, 7 a 10 % em volume de álcool, além de outros componentes de natureza líquida, sólida e gasosa. O álcool presente neste vinho é recuperado pela destilação, processo de separação de componentes de uma mistura baseado nas suas capacidades de evaporação em uma dada temperatura e pressão. Na destilação, a mistura é aquecida até a fervura, sendo que os vapores são resfriados até se tornarem líquido novamente.


Assim, o efeito final é o aumento da concentração do componente mais volátil (álcool) no vapor e do componente menos volátil (caldo fermentado) no líquido. Por este processo obtém-se, a partir de um vinho de 7 a 9% de teor alcoólico, um teor próximo a 96% em etanol. A partir deste ponto ocorre um fenômeno físico, denominado “azeotropia” e a destilação fracionada não funciona mais. A mistura nesta composição é chamada “mistura azeotrópica”. A formação da mistura azeotrópica na destilação determina a existência de duas classes de álcool: álcool hidratado e álcool anidro ou absoluto. As especifi- cações para os tipos de álcool hidratado e do anidro dependem basicamente da aplicação que será dada ao álcool.


O álcool hidratado, produto final dos processos de destilação e retificação, é uma mistura binária álcool-água que atinge um teor da ordem de 96°GL. Este álcool hidratado pode ser comercializado desta forma para ser utilizado em carros a álcool e bicombustíveis ou pode sofrer um processo de desidratação para se tornar anidro e ser utilizado como mistura carburante na gasolina.


Atualmente, três métodos principais são usados na obtenção de etanol anidro, a destilação azeotrópica, destilação extrativa e destilação com peneiras moleculares. De fato, sendo a secagem do álcool mais uma etapa de fabricação que requer adicionais trabalho, gastos e energia, deve-se considerar muito seriamente as vantagens e desvantagens de se fabricar álcool hidratado ou anidro.


3. Considerações finais
Para se calcular o potencial em etanol por área de qualquer matéria-prima, é necessário saber o seu conteúdo de carboidratos e considerar a produtividade de matéria-prima por hectare. A quantidade de etanol gerada é de cerca de 700 L/ton de carboidratos. A canade- açúcar tem uma quantidade de açúcares entre 12 e 17% e produtividade agrícola média de 77 ton/ha na região centro-sul do Brasil, o potencial em etanol da cana é entre 6500 e 8000 L/ha. Para a batata, considerando-se um teor de carboidratos de entre 12 e 28 % e uma produtividade agrícola de 15 a 30 toneladas/ha, tem-se um potencial em etanol entre 1250 e 5900 L/ha.


O requerimento de um pré-tratamento como diferença de processo é uma desvantagem para o amido, mas por outro lado, há cultivares de batata com teor desses carboidratos em maiores concentrações por unidade de matéria prima vegetal do que a sacarose da cana jamais poderá atingir. Isso pode significas uma vantagem por diminuir consideravelmente o manuseio dos volumes mássicos com implicações em investimentos; custeio do sistema; custos de logística, energia, mão de obra, remoção resíduos, etc.


Finalmente, considerando-se os custos do trato cultural da batata (˜ R$ 13.000,00) comparados com o da cana, (˜ R$ 2.000,00) por hectare, conclui-se que a produção de etanol combustível de batata poderia ser viável apenas em condições especiais onde se permita o aproveitamento de resíduos (material fora de tamanho, com brotação ou cascas da indústria ou cozinhas industriais) e mesmo assim se não houver grande custo de transporte dos mesmos à usina.

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