Batata Transgênica. Estado da arte no Brasil e no mundo.

Eduardo Romano* romano@cenargen.embrapa.br Damares de Castro Monte** Antonio Carlos Torres*


Os autores são pesquisadores dos centros da Embrapa: *Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia – CENARGEN, C. P, 02.372, 70849 Brasília, DF **Embrapa Hortaliças, C. P. 218, 70359-970 Brasília, DF


Plantas transgênicas no mundo
Apesar de alvo de controvérsias principalmente de algumas organizações não governamentais e por parte do consumidor europeu, as plantas transgênicas são uma realidade no mundo e vem sendo consumidas por milhões de seres humanos, incluindo boa parte da Europa A área total de transgênicos cultivada em todo o mundo já atinge 44,2 milhões de hectares. Desde a primeira liberação comercial para consumo em 1994 pelo Estados Unidos, o total de área plantada tem demonstrado um enorme crescimento. Entre 1996 e 2000, a área global de plantas transgênicas teve um aumento superior a 25 vezes. De 1,7 milhões de hectares em 1996, passando por 27,8 milhões de hectares em 1998 e alcançando 44,2 milhões de hectares em 2000. O número de países produtores mais do que dobrou no mesmo período de tempo, aumentando de 6 em 1996 para 13 em 2000. Deve-se ressaltar que apesar de apenas 13 países serem produtores, a maior parte do mundo consome plantas transgênicas. A maior parte da área cultivada, aproximadamente 84%, corresponde aos países industrializados, principalmente Estados Unidos, Canadá e Austrália. Nos países em desenvolvimento a Argentina é o país que possui a maior área plantada. No Brasil ainda não existe oficialmente plantações de transgênicos a nível comercial.


Obviamente as culturas transgênicas com maior área plantada correspondem a commodities. A soja é a cultura mais plantada ocupando 58% da área total de transgênicos no mundo com aproximadamente 25,8 milhões de hectares, até o final de 2000. Em segundo lugar, encontra-se o milho com 10,3 milhões de hectares, enquanto o algodão transgênico ocupa o terceiro lugar com 5,3 milhões de hectares. Batata transgênica é cultivada em diversos países como Estados Unidos, Canadá, México e países do leste europeu. Esta cultura ocupa a quinta posição em área cultivada, correspondendo a aproximadamente 1% da área total. A batata fica bem atrás das 3 principais culturas transgênicas em termos de área cultivada.


Isto se dá, pelo fato da batata não ser um produto de exportação tão importante quanto culturas como soja, milho e algodão. No entanto, a utilização da transgenia traz benefícios claros aos produtores que adotam esta tecnologia. No México, estudos recentes do impacto de batatas transgênicas com resistência aos vírus PVX, PVY e PLRV, mostram que essa tecnologia reduz em 13% os custos de produção, em grandes plantios e, em 32% para pequenos produtores (Qaim, 1998).


Porque utilizar plantas transgênicas?
É importante esclarecer que a engenharia genética é apenas uma ferramenta a mais que vem auxiliar os programas de melhoramento que são realizados basicamente por cruzamentos entre espécies cultivadas e espécies selvagens com compatibilidade sexual. Através destes cruzamentos ocorre a transferência de genes da espécie selvagem para a cultivada. O principal objetivo do melhoramento é a introdução de genes que levem a um aumento de produtividade. A grande limitação do melhoramento por cruzamentos é que o “pool” gênico disponível fica restrito a espécies sexualmente compatíveis. Já através da engenharia genética, virtualmente qualquer gene, oriundo de qualquer organismo, pode ser transferido para plantas. No caso da batata, o melhoramento genético é extremamente dificultado pelo fato desta cultura ser tetraplóide e frequentemente possuir baixa fertilidade, tornando o desenvolvimento de novas cultivares extremamente difícil.


Por outro lado, a engenharia genética pode introduzir genes diretamente sem alterar o genoma da planta receptora. Desta forma pode-se manter todas as características originais da cultivar que são apreciadas pelos produtores e consumidores acrescidas de uma característica de interesse, como resistência a viroses. Os principais métodos para obtenção de plantas transgênicas são os baseados em Agrobacterium tumefaciens, e os chamados métodos diretos principalmente o processo de biolística. Para uma revisão completa sobre este assunto recomendamos a leitura do “Manual de Transformação Genética de Plantas” publicado pela EMBRAPA e de autoria de Brasileiro e Carneiro, 1998.


Batata transgênica no Brasil Uma das principais barreiras para a produção de batata no mundo é a suscetibilidade a diversas viroses, sendo as principais causadas pelo Vírus Y da batata (PVY) e o Vírus do enrolamento da folha da batata (PLRV). Para evitar a redução da produção desta cultura, o produtor frequentemente recorre ao uso de tubérculos-sementes de batata para instalar suas lavouras. Isso eleva o preço final da batata entregue ao consumidor, além de prejudicar o produtor na competição com a batata-semente importada. No Brasil, plantas de batata Achat com resistência a PVY foram desenvolvidas como resultado de um trabalho de parceria entre a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Embrapa Hortaliças, e o Instituto de Ingenieria Genética y Biotecnologia (INGEBI-Argentina), com apoio do CNPq, do programa RHAE/ Biotecnologia, do Centro Brasileiro Argentino de Biotecnologia e da FAP/DF. Resumidamente os passos seguidos para a obtenção da batata transgênica resistente ao PVY foram: 1) clonagem do gene do capsídio do PVY; 2) obtenção de construções quiméricas para transformação de batata; 3) obtenção de plantas transgênicas com o gene do capsídio do PVY; 4) desafio das plantas transgênicas contra o PVY e 6) seleção de clones resistentes ao PVY. Através desse processo foram obtidos clones de batata achat com alta resistência ao PVY.


Bio-segurança e desenvolvimento de produto
Qualquer produto transgênico antes de ser incorporado ao mercado necessita de passar por rigorosos testes de segurança ambiental e alimentar e cada produto é estudado caso a caso. A EMBRAPA pretende eleger algumas plantas transgênicas desenvolvidas na empresa para fazer análises de biosegurança alimentar e ambiental. Um dos candidatos é a batata transgênica. Outros são: feijão com resistência ao mosaico dourado, mamão com resistência ao vírus da mancha anelar, soja tolerante a herbicida entre outros. As análises alimentares e de bio-segurança são extremamente caras. Podem custar por volta de 1 a 2 milhões de Reais. Portanto, a escolha dos produtos deve ser extremamente criteriosa. A batata resistente ao PVY tem uma série de características que a torna um bom candidato para os testes de segurança ambiental e alimentar: 1) a resistência obtida assim como os genes inseridos se demonstram estáveis por mais de 3 anos; 2) a cultivar Achat não floresce o que evita problemas de fluxo gênico; 3) os produtos gênicos dos genes inseridos, npt II e da capa protéica, são considerados seguros do ponto de vista alimentar. O primeiro é encontrado na maioria dos produtos transgênicos comercializados e os potenciais riscos para a saúde humana e animal já foram bem estudados (Flavell et al., 1992). A proteína da capa protéica também já foi objeto de vários estudos sendo que nenhum risco a saúde foi detectado. Deve-se citar que a proteína da capa protéica é frequentemente consumida em batatas naturalmente infectadas pelo PVY. O principal aspecto contrário a utilização da batata transgênica como um dos produtos eleitos pela EMBRAPA para ser sujeita aos testes alimentares e ambientais é a atual baixa produção da cultivar Achat no país. No início do projeto esta cultivar era uma das mais importantes no Brasil, com cerca de 45.000 hectares plantados (aproximadamente 25% da área total cultivada de batata no país). Recentemente a área plantada foi extremamente reduzida. Um dos motivos (não o único) para esta redução foi exatamente a suscetibilidade pelo PVY e portanto a característica introduzida pode levar a uma retomada da
produção de Achat no país. O principal ponto positivo deste trabalho foi a demonstração que a EMBRAPA domina a tecnologia de obtenção de batatas resistentes ao PVY. O mesmo gene utilizado com sucesso na cultivar Achat pode ser introduzido em outras cultivares como a Bintje. Também estamos desenvolvendo batatas resistentes ao PLRV mediante a expressão do gene da replicase. Pretendemos futuramente obter plantas que combinem resistência as duas viroses. Esta batata com dupla resistência, traria uma enorme redução no efeito da degenerescência da batata, aumentando a produtividade e reduzindo os custos para o produtor já que estes não necessitariam de comprar a cada plantio, tubérculossementes de batata para instalar suas lavouras.


A sociedade brasileira está lentamente começando a tomar conhecimento dos avanços e mudanças geradas nos vários setores produtivos com o progresso da biotecnologia. Essa é uma das primeiras plantas transgênicas de interesse agronômico desenvolvida no Brasil. O que vai determinar se ela chegará ao consumidor final é a confirmação do seu benefício para o setor produtivo e para o consumidor, assegurando-se o equilíbrio do meio ambiente.


Literatura recomendada:
JAMES, C. Global Status of Commercialized Transgenic Crops: 2000. ISAAA Briefs No. 21: Preview. ISAAA: Ithaca, NY. 2000


BRAUN, C.J.; JILKA, J.M.; HEMENWAY, C.L. & TUNER, N.E. Interactions between plants, pathogens and insects: possibilities for engeneering resistance. Current Opinion in Biotechnology, v. 2, p.193-198, 1991.


GHISLAIN, M. & GOLMIRZALE, A.. Genetic engineering for potato improvement. In: KHURANA, P. (ed.) Comprehensive potato biotechnology. India, 1998.


HANNEMAN, R.E. JR. The Testing and release of transgenic potatoes in the North American center of diversity. In: KRATTIGER, A.F. & ROSEMARIN, A.. (eds.). Biosafety for sustainable agriculture: sharing biotechnology regulatory experiences of the Westhern hemisphere. International Service for the Acquisition of Agri-biotech Applications (ISAAA), Stockholm Environment Institute (SEI), Ithaca and Stockholm, p.47-49, 1997.


QAIM, M. Transgenic virus resistant potatoes in Mexico: potential socioeconomic implications of North-South biotechnology transfer. ISAAA: Briefs No. 7 , 1998.

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