Fitopatologia-Batata x Citros: Zebra da Batata Frita (Potato Zebra-Chip) x HLB (Greening) dos Citros

O que existe em comum e diferente?


Durante a 17ª Conferência Trianual da Associação Européia da Batata (EAPR 2008), ocorrida em julho deste ano na Romênia, uma das palestras que chamou muito a atenção dos congressistas (*), foi a que tratou de uma nova e devastadora doença da batata, denominada “Zebra Chip” (ZC), que aqui traduzimos como: Zebra da Batata Frita (ZBF). Essa palestra foi apresentada pelo Dr. Joseph E. Munyaneza, em trabalho de colaboração com o Dr. James M. Crosslin [ambos do Yakima Agric. Research Lab., Wapato, WA (EUA) (**)]. Registros de milhões de dólares de prejuízo foram apresentados, tanto para produtores como para processadores de batata, particularmente nas regiões do oeste dos EUA, México e Caribe. Os resultados apresentados foram baseados em pesquisas, sob condições de campo e de telado, feitas com as variedades Atlantic e FL 1879, FL 1833 e FL 1867, permitindo conhecer, até o momento, aspectos de epidemiologia, inseto transmissor, sintomas, mas não ainda, o patógeno ou agente causador da ZBF. Suspeitas iniciais de fitoplasma foram descartadas. O texto na íntegra, dessa e demais palestras e trabalhos apresentados no EAPR 2008 podem ser consultados no site: (http://www.eapr2008-brasov.com/abstract_book.php. Sob permissão do Dr. J. Munyaneza, apresentamos neste artigo algumas fotos extraídas de suas publicações. Essas fotos ilustram os sintomas da ZBF na parte aérea (folhagem) e nos tubérculos de batata, antes e após processamento (fritura). Neste artigo, faremos um relato sumário do que foi apresentado na referida palestra, acrescentando conhecimentos adicionais sobre a ZBF, disponíveis na literatura recente, desde o evento. Entre os conhecimentos adicionais, a possível interação da ZBF com a devastadora doença do Huanglongbing (HLB, “doença do dragão amarelo”), mais conhecida como “Greening” dos citros, presente no Brasil, foi sugerida conforme apresentamos neste artigo.


 


Sintomas da “Zebra Chip” ou “Batata Frita Zebrada – ZBF”


Os sintomas na parte aérea das plantas afetadas pela doença ZBF (Foto 1), são semelhantes aos causados pela infecção primária do vírus do enrolamento da folha (PLRV), em fase jovem da planta ou pela anomalia do “amarelecimento por fitotoxemia de psilídeos” (Homóptera: Psyllidae), por exemplo, gen. Paratrioza cockerelli (Sulc), ou Bactericera cockerelli. Pode ser confundido também com danos causados por rizoctonia ou pelo fitoplasma (ainda não relatado no Brasil) causador do “Purple Top” (ou Topo Roxo), sinônimo da doença “Beet Leafhooper Transmitted Virescence Agent”, que é transmitida pela cigarrinha (Hemíptera: Cicadellidae), gen. Circulifer tenellus. Os sintomas do ZBF nos tubérculos frescos, recém colhidos de plantas infectadas apresentam: inchaço das lenticelas (alargadas); estolões amorfos; descoloração amarronzada dos anéis vasculares, com pequenas marcas ou pontos (flecks) necróticos dos tecidos internos (polpa), podendo apresentar riscas pardas na medula. Essas necroses afetam os tubérculos todo do estolão ároseta (Foto 2). A produtividade em peso de tubérculos cai em média 60% da expectativa e os tubérculos produzidos sofrem redução em matéria seca, ficando em média 13% do normal (19%). Os sintomas do ZBF nos tubérculos após processamento (fritura), na forma de palito ou “chips” (Foto 3), apresentam necrose escura em forma de malha ou riscas (daí a denominação de “Zebra Chip” ou Batata Frita Zebrada). Essas riscas escuras são resultantes da transformação do amido em açúcares solúveis causados pela doença ZBF, sendo mais evidente e depressivo após a fritura, tornando o produto rejeitado para o processamento. Em tubérculos de plantas sadias, esses sintomas não estão presentes após fritura (Foto 4).


 


ZBF x batata-semente


Tubérculos progênies de plantas de batata afetadas, com os sintomas da ZBF, geralmente não brotam, mas se brotarem, ficam afilado (“fio-decabelo”). Nesse aspecto, pode-se considerar que o problema da ZBF estaria limitado à infecção primária. A falta de germinação restringiria ou impediria a disseminação do ZBF por perpetuação (secundária), via tubérculo/batatasemente. Pode-se considerar que a ZBF como não é o problema na produção para semente, mas sim na de consumo e/ou processamento.


 


ZBF x inseto vetor [Bactericera (=Paratrioza) cockerelli Sulc]


O estado-da-arte sobre a doença ZBF revela associação de 63 à 87% com a espécie de psilídeo Bactericera cockerelli (Sulc). Os resultados obtidos ainda não permitiam afirmar a associação da ZBF com nenhum fitoplasma, Porém, o fato de haver perpetuação dos sintomas da ZBF em testes de transmissão por enxertia sucessiva, revelou a presença de algum outro patógeno (presença de fator biótico). Sabe-se que em testes de enxertia, apenas fatores bióticos são perpetuáveis, fica excluída a possibilidade da causadora da ZBF ser apenas uma toxemia devido áalimentação por psilídeos.


 


ZBF x agente biótico (microorganismo): Bacteria Candidatus Liberibacter


A recente descoberta, feita por cientistas da Nova Zelândia de que uma nova espécie de bactéria do gênero Candidatus Liberibacter havia sido molecularmente identificada em tubérculos de batata, os quais apresentavam sintomas típicos da ZBF, foi divulgada nos corredores do Congresso (EAPR 2008). Recentemente essa descoberta foi publicada por Liefting et al. na revista científica Plant Disease 92(10:1474, Oct.2008. Os estudos foram feitos com tubérculos de batata apresentando ZBF, produzidos fora da área comercial, em campo de melhoramento genético naquele país. Por meio de análises de PCR e sequenciamento da região 16S rDNA, comum do genoma das bactérias, esses cientistas observaram que havia 100% de identidade com a espécie Ca. Liberibacter isolada também de psilídeos [Bactericera (= Paratrioza) cockerelli Sulc] presentes em batatal na Nova Zelândia. Observou-se também que essa espécie de bactéria estava presente na plantação de tomate e pimentão. Embora a descoberta tenha sido feita em campo experimental e não comercial na Nova Zelândia, houve imediata resposta dos países importadores de tomate, pimentão e batata, tais como Austrália, Fiji e Japão. No total, exportações de tomate e pimentão têm um valor superior a 40 milhões de dólares anualmente para a Nova Zelândia (Dr. Moshe Bar-Joseph em e-mail ao Dr. Elliot W. Kitajima, microscopista eletrônico, Esalq-USP, Piracicaba, SP). O relato de Nova Zelândia a cerca do agente causal do ZBF (http://www.biosecurity.govt.nz/pests-diseases/plants/potato-tomato-psyllid.htm), foi seguido de um outro relato feito nos Estados Unidos, confirmando identificação da mesma espécies de “Ca. Liberibacter” spp em tubérculos colhidos de planta com sintomas de ZBF, encontradas em duas plantações no Texas (EUA) (https://www.wpdn.org/common/news_events/candidatus_liberibacter/APHIS%20SPRO%202008-32_ 7-14-08.pdf . As pesquisas nos EUA revelam que a espécie de Ca. Liberibacter identificada em batata, naquele país, apresentava diferenças genomicas acima de 3%, quando comprada com outras espécies dessa bactéria (Ca. Liberibacter) encontrada em plantas cítricas, causadoras da destrutiva doença da citricultura, popularmente conhecida como “Greening dos Citros”: “Ca. L. asiaticus” (Las) and “Ca. L. africanus” (Laf), com 4% de identidade e; “Ca. L. americanus” (Lam) com 6.0 – 6.3% de identidade (Lin, H. et al, 2008, MS Revision JPP).


 


ZBF x HLB (vulgo “Greening”) dos citros”)


Conforme relatos recentes de especialistas do Centro APTA Citros Sylvio Moreira, IAC, Cordeirópolis,SP (Machado, M.A et al. 2008. Tropical Plant Pathology 33(Suplm):S70-S71); o HLB está presente desde 1919 em laranjais da China. Chegou no continente Americano em 2004 (São Paulo, Brasil); posteriormente (2005) na Flórida (EUA) e mais recentemente em Cuba (2007). Os sintomas nos citros são: deficiência nutricional, paralização de crescimento, mosqueamento de folhas; florescimento fora de época, frutos pequenos e assimétricos com queda prematura. O controle do “greening” no Brasil tem sido feito através de legislação própria, que determina inspeções de monitoramento e erradicação de plantas sintomáticas (comprovadamente infectadas). Há evidências de que espécies de Ca. Liberibacter, causadoras do HLB nos citros, podem infectar plantas de outras espécies, como Vinca (Cataranthus roseus) e fumo (Nicotiana tabacum), através de uma planta parasitária conhecida como cuscuta (Cuscuta campestris). Com relação ao psilídeo vetor do HLB, Coletta-Filho aponta que duas espécies estão associadas: Diaphorina citri de ocorrência na àsia e América (no Brasil existe relatos desde 1960) e Trioza erytreae, presente na Àfrica. D. citri esta associada átransmissão das espécies asiática e americana de Liberibacter, enquanto T. erytreae à espécie africana. Informações vindas também dos colegas da citricultura revelam que Ca Liberibacter spp, causadora do HLB dos citros, passa facilmente (experimentalmente) de plantas cítricas não apenas por psilídeos, mas (pelo menos experimentalmente), também via cuscuta (espécie parasita infestante da vegetação espontânea).


 


HLB + (Las; Laf; Lam) + psilideos = ZBF (Zebra da Batata Frita)?


Apesar das evidências moleculares estarem apontando que as três espécies de Ca. Liberibacter que causam o HLB nos citros são espécies diferentes das causadoras do ZBF, ainda que se localizem em posições próximas na árvore genealógica (análise filogenética), estamos empenhados na busca de confirmação biológica da não interação (infecção) entre a doença HLB dos citros com as variedades de batata mais cultivadas no Brasil, particularmente as cv. Atlantic (sabidamente suscetível à ZBF) e Asterix, mais utilizadas e recomendadas para o processamento (fritura), bem como as cvs àgata e Cupido, para consumo in natura. Em parceria com a equipe de cientistas do Centro APTA de Citricultura, do IAC em Cordeirópolis, estamos iniciando os testes de avaliação da transmissão (via cuscuta) da Ca. Liberibacter causadora do HLB dos citros para plantas das referidas cultivares de batata. Os testes estão em fase de preparo das plantas, dentro de estufas do sistema isoladas (a prova de insetos) naquele Centro. O objetivo desse estudo preliminar e exploratório é o de verificarmos se há ou não, no Brasil, interação entre o HLB e o ZBF em nossas condições (experimentais). A justificativa é a de adquirir conhecimentos qualitativos (passa ou não passa do citros para batata); quantitativos (nível de interação Ca Liberibacter spp x cv. batata x outras solanáceas); sintomatologia; técnicas de diagnose; aquisição e transmissão no vetor, entre outros conhecimentos, estarão sendo considerados nessa pesquisa exploratória. Para não darmos chance ao azar, ou melhor à “zebra”, estamos nos preparando com antecedência. Já perdemos no “jogo sujo” do PVYntn em nosso campo (da bataticultura). Tínhamos chance de ganhar, derrotar (= erradicar) o inimigo (PVYntn), em tempo, mas o “juiz” não nos deixou. A(o) pesquisa(dor) perdeu no tapetão. Deu no que está dando! Nessa nova “jogada” iniciada no campo da pesquisa, tivemos o apoio da “torcida”: associações, bataticultores, extensinistas, professores, estudantes etc. Estamos tentando conhecer, com antecedência, a “tática” desse novo e potencial adversário. A bataticultura brasileira não merece essa “ZEBRA”!


José Alberto Caram de Souza Dias, Eng. Agr., PhD, Pesquisador Científico
APTA-IAC/CPD Fitossanidade;
jcaram@iac.sp.gov.br


Helvécio Della Coletta Filho,, Eng. Agr., PhD, Pesquisador Científico
Centro APTA Citros Sylvio Moreira


Marco Antonio Machado, Eng. Agr., PhD, Pesquisador Científico
Centro APTA Citros Sylvio Moreira


IAC. Cx.P. 28 / CEP 13020-902, Campinas (SP),
fones: (19) 3241-5847 / 9256-1961


Fotos: Cortesia do Dr.J. E. Munyaneza


   

 




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