É importante padronizar o signifi cado desses termos a fim de evitar comparações e, até mesmo,confusões.
Comumente, pesquisadores, técnicos e produtores empregam os termos “tolerantes” e “resistentes” para classifi car a reação das variedades em resposta à infecção por patógenos. Frequentemente, esses termos são empregados de modo intercambiável e até mesmo como sinônimos. Entretanto, em fi topatologia há diferenças importantes associadas à tolerância e resistência. Essa nota tem por objetivo esclarecer o signifi cado desses termos e, adicionalmente, espera-se contribuir para que haja a padronização no seu uso.
Resistência
Quanto ao conceito de resistência, não há um consenso ou defi nição unificada. Três defi nições serão apresentadas:
Segundo Fry (1982), resistência é a característica de uma planta que restringe o desenvolvimento do patógeno e da doença. Strange (2003) defi ne como o retardo da infecção e crescimento do patógeno nos tecidos do hospedeiro e Parlevliet (1997) conceitua resistência como a habilidade da planta em suprimir, retardar ou prevenir a entrada ou a subsequente atividade do patógeno (crescimento e desenvolvimento) em seus tecidos. Nessa matéria, será adotada essa última defi nição, por entendermos ser a forma mais abrangente e clara sobre a resistência de plantas a doenças.
Porém, vale ressaltar um ponto importante, comum às três defi nições: não há menção sobre os efeitos da resistência sobre a produção da planta. Pode-se afi rmar que as espécies vegetais (batata, milho, tomate, soja, café, trigo etc) são imunes ou completamente resistentes (ausência de doença) à maioria dos fitopatógenos. Dois processos determinam a resistência da cultivar na maioria dos fitopatógenos: 1. A resistência a certos patógenos se deve ao fato da espécie da planta pertencer a um grupo taxonômico que é naturalmente imune ao patógeno. Este tipo de resistência é denominada “do tipo não-hospedeira” ou 2. A planta possui genes para resistência contra o patógeno, processo esse denominado de resistência verdadeira (Agrios, 2005). A resistência verdadeira é geneticamente controlada pela presença de um, poucos ou muitos genes para resistência, portanto é característica herdável. Com isso, o hospedeiro e o patógeno podem ser incompatíveis em maior ou menor grau, seja devido à falta de reconhecimento químico entre os dois ou porque a planta hospedeira se defende da infecção causada pelo patógeno (Agrios, 2005).
Van der Plank (1963) classifi cou a resistência de plantas a doenças em dois tipos: resistência vertical (RV) e resistência horizontal (RH). A RV é também conhecida como resistência raça-específi ca, qualitativa, monogênica ou oligogênica (um ou poucos genes de efeito maior), diferencial e completa. Tem como característica não ser afetada pelo ambiente temperatura, umidade, pH do solo, radiação solar etc.), e a expressão da resistência é manifestada de apenas duas formas: resistência total ou imunidade e suscetibilidade total, dependendo da interação com as raças do patógeno (Mizubuti
& Maffi a, 2006). (Figura 1) Pode-se notar que a cultivar A possui resistência vertical (100% de resistência) às raças 2, 4, 5 e 8, e alta suscetibilidade (0 % de resistência) para as raças 1, 3, 6 e 7. Portanto, na RV há nítida diferenciação entre raças de determinado patógeno, uma vez que atua efetivamente contra certas raças específicas, mas não exerce ação alguma sobre outras (Mizubuti & Maffi a, 2006).
Figura 1- Reação de resistência da cultivar A de uma espécie hospedeira a diferentes raças do patógeno.
A RH é também conhecida como raça não específi ca, quantitativa, poligênica (vários genes de efeito menor), não diferencial e incompleta. Tem como característica de ser afetada pelo ambiente, leva a planta a ter certo grau de doença e é dependente da interação de várias raças do patógeno versus o cultivar do hospedeiro. Nesse tipo de resistência, observam-se níveis variados de doença e a planta atua reduzindo a taxa de progresso da doença (r) (Mizubuti & Maffia, 2006). Figura 2. Na cultivar B, pode-se notar que ocorrem níveis variados de resistência e que há um nível basal de resistência às diferentes raças do patógeno (linha horizontal azul). A cultivar B apresentou maior resistência às raças 2, 6 e 8 e menor resistência as raças 1, 4 e 7. Houve um grau mínimo de resistência (20) a todas as raças do patógeno (Mizubuti & Maffi a, 2006). Nota-se que uma cultivar como a B, que apresentou RH também pode apresentar RV a determinada raça, mas o contrário não é verdade. A cultivar B apresentou RV apenas à raça 2 do patógeno.
Tolerância
O conceito de tolerância apresenta algumas controvérsias e, atualmente, não há um consenso quanto a sua melhor definição. Existem várias defi nições de tolerância, porém, três serão mencionadas: a defi nição clássica é a de Caldwell et al. (1958), na qual tolerância “é a capacidade das plantas suportarem a doença sem perdas severas em
produtividade ou qualidade”. As demais defi nições foram derivadas dessa primeira. Segundo Camargo (1995), tolerância refere-se a capacidade inerente ou adquirida de uma planta em suportar a infecção por patógeno (fungo, vírus, nematóides, bactérias etc) sem que ocorram danos signifi cativos em sua produção. Agrios (2005) defi ne como a
habilidade das plantas produzirem uma boa colheita, mesmo quando infectadas por um patógeno. Ribeiro do Vale etal., (2004) defi nem tolerância como a habilidade de uma cultivar, em relação a outra, com mesmo potencial produtivo, de ser menos afetada na produção com a mesma intensidade (incidência ou severidade) de doença. Cabe esclarecer que incidência é uma medida de intensidade de doença normalmente quantificada pela porcentagem de plantas doentes numa área. A severidade é outra forma de medir intensidade de doença, porém, com base na porcentagem de tecido vegetal afetado pelo agente causal (patógeno).
Figura 2 – Reação de resistência do cultivar B de uma espécie hospedeira a diferentes raças do patógeno.
Os conceitos apresentados anteriormente enfatizam que a produção ou rendimento e a intensidade de doença são as variáveis mais importantes a serem avaliadas quando se deseja quantificar a tolerância. Tolerância envolve algum grau de compensação do dano causado pela doença. Segundo vários autores, plantas podem tolerar infecção pelo patógeno de diferentes maneiras, principalmente, com o aumento de atividades ou processos como: a concentração de clorofi la das folhas; tamanho de folhas novas; número de novos ramos; período em que folhas infectadas permanecem aderidas à planta e a captação de nutrientes – processos esses envolvidos diretamente na produção. Plantas tolerantes produzem mais que plantas não tolerantes ou menos tolerantes, sob mesma intensidade de doença. Entretanto, embora as plantas tolerantes possam apresentar bons rendimentos quando doentes, maiores produçies são alcançadas quando as plantas estão sadias (Agrios, 2005). Assim, quando se emprega o termo tolerância é necessário considerar o potencial produtivo das plantas, a intensidade de doença e a quantidade produzida.
Plantas tolerantes são afetadas pelo patógeno mas, geralmente, o dano é menor do que o constatado em plantas não tolerantes. Contudo, ainda não se conhece exatamente como o processo de tolerância é determinado. A genética da tolerância às doenças ainda não está devidamente compreendida (Agrios, 2005) e isso difi culta o desenvolvimento
de cultivares tolerantes. Essa falta de conhecimento é devida, ao menos em parte, pelo fato de ser uma variável difícil de ser medida e de ser facilmente confundida com a resistência horizontal (do tipo parcial). Quanto a esse último fator, ainda não se sabe se há algum relacionamento entre tolerância e resistência horizontal.
Resistência x Tolerância
Algumas situações acontecem no campo onde os conceitos de resistência e tolerância podem ser adotados (Figura 3).
Para analisar a Figura 3, adotou-se a defi nição de Ribeiro do Vale et al., (2004). O pressuposto é que todas as cinco cultivares têm o mesmo potencial produtivo.
Figura 3 – Intensidade da doença medida, por exemplo, como a porcentagem de área foliar afetada, e produtividade, medida em toneladas por hectare, de cinco cultivares de uma espécie de planta.
Comparando a cultivar 1 com a 2, nota-se que a intensidade da doença foi a mesma, mas a cultivar 1 produziu mais; portanto, a cultivar 1 é mais tolerante que a 2. Porém as cultivares 1e 2 não diferem quanto à resistência. A cultivar 1 não é mais tolerante que as cultivares 3, 4 e 5; porque não ocorreu a mesma intensidade de doença. A tolerância é mais usada para comparar uma cultivar em relação à outra. Ao comparar a cultivar 2 com a 3, nota-se que a produtividade foi a mesma, mas a intensidade da doença na 3 foi menor. Portanto, a cultivar 3 é mais resistente que a 2. Apesar de terem a mesma produtividade, não se pode dizer que uma é mais ou menos tolerante que a outra, pois houve diferença na intensidade da doença. A cultivar 4 não apresentou doença e, por isso, apresentou maior produtividade. Portanto, essa cultivar possui RV às raças do patógeno presentes no local do cultivo. Neste caso, a cultivar 4 foi imune à doença. Por outro lado, a cultivar 5 apresentou 100% de doença, com isso a produtividade foi muito
baixa. Essa cultivar é suscetível e, portanto, não possui resistência às raças do patógeno presentes no local do cultivo.
Em trabalhos de campo, quando se faz a análise de cultivares de uma determinada espécie de planta quanto a resistência às determinadas doenças, o ideal é comparar os cultivares e classificá-los quanto à resistência. Propõe-se o emprego do termo imune, quando houver ausência de doença em determinada cultivar, porém presença em outras; resistente quando houver menor intensidade de doença comparada a um padrão de suscetibilidade e suscetível quando houver alta ntensidade de doença, igual ou superior a um padrão de suscetibilidade. Caso haja necessidade de maior resolução das cultivares dentro de cada classe (resistente ou suscetível), novas subdivisões poderão ser ajustadas. No entanto, na maioria dos casos estas subdivisões são subjetivas e variam conforme os autores. Para padronizar a terminologia, propõe-se que se utilizem as categorias descritas na Tabela 1. Por exemplo, se no padrão de suscetibilidade
a severidade da doença é 94%, então serão considerados materiais resistentes aqueles que apresentem de 0,94% a 23,5% de severidade. Como moderadamente resistentes aqueles que apresentarem de 24,4 a 47% de severidade e assim sucessivamente. Posteriormente, se houver necessidade de determinar a tolerância, deve-se comparar cultivares umas em relação às outras de mesmo potencial produtivo, sob mesma intensidade de doença. Comentários finais:
• O uso dos termos deve ser padronizado para facilitar comparações e evitar confusão. Por exemplo, de acordo com os conceitos apresentados, uma cultivar pode ser resistente, mas não tolerante.
• Na maioria das situações, avaliase a resistência de cultivares, não a tolerância. Portanto, recomenda-se a utilização do termo resistência.
• O termo tolerância somente deve ser utilizado quando há comparação entre cultivares de mesmo potencial produtivo, sob mesma intensidade de doença e quando se avalia produtividade.
Referências bibliográficas:
Consulte autores:
Henrique da Silva Silveira Duarte (1), Laércio Zambolim (2) & Eduardo S. G. Mizubuti (3)
(1) Mestrando do Departamento de Fitopatologia da UniversidadeFederal de Viçosa
e-mail: hdssd@yahoo.com.br
(2) Prof. Titular do Departamento de Fitopatologia da Universidade Federal de Viçosa.
e-mail: zambolim@ufv.br
(3) Prof. Associado do Departamento de Fitopatologia da Universidade Federal de Viçosa
e-mail: mizubuti@ufv.br
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