Fitosssanidade – Na pista da “Trilha”

Lesão alongada e seca em batatas ainda está sem causa definida


Na natureza é assim mesmo:surpresas acontecem para comprovar que biologia não é ciência exata. Ainda mais quando se trata de batata, essa cultura fascinante e cheia de segredos revelados a cada cultivo, seja lá quando e onde for. Arrancar batata é garantia de adrenalina alta para o produtor; a qualidade da pele dos tubérculos é quase tão importante quanto a quantidade produzida. Sarnas, lenticeloses e podridões, que se mostram somente na colheita, desqualifi cam o produto e causam frustração para quem considerava que havia conduzido a cultura de maneira correta até então. Os tubérculos são caules modifi cados, produzidos debaixo da terra, por isso não têm a mesma capacidade de resistir ao ataque de pragas de solo quando comparados com hortaliças-raiz, como batata-doce ou mandioquinha-salsa. Pelo contrário, são órgãos tenros e nutritivos apreciados não só pelo homem, mas também por insetos e microrganismos de solo, que também buscam formas de sobreviver e multiplicar no competitivo ambiente subterrâneo. Para a batata chegar às bancas dos mercados, com aquela pele lisa e brilhante exigida pelo consumidor, as decisões sobre a cultivar, o tipo de solo, os agrotóxicos, a adubação e a irrigação formam uma intrincada combinação, da qual o produtor não pode abrir mão sob pena de não se manter no mercado. Sob o ponto de vista biológico, são várias dezenas de espécies de organismos de solo que atacam os tubérculos formados ou em formação, penetrando os tecidos diretamente ou, principalmente, através de pontos fracos como gemas (olhos), lenticelas e ferimentos físicos causados por insetos. Iniciado o ataque, as partes atacadas ficam enfraquecidas e sujeitas à invasão de saprófi tos ou parasitas secundários. Conhecido o inimigo, o combate fica mais fácil. Mas o que fazer quando se tem uma anormalidade de causa (etiologia) desconhecida? Como realizar o diagnóstico e propor soluções de controle? O produtor não tem muita opção nesses casos, a não ser apelar para  aboratórios de fitossanidade de entidades públicas e privadas.




Mistério ainda não desvendado

As anormalidades, um dia inéditas, foram desvendadas. Aconteceu assim com a “trilha”. Este foi o sugestivo nome dado a uma lesão alongada seca na batata, mais ou menos superfi cial, isolada do restante do tubérculo por camada suberizada, que lembra um dano provocado por inseto minador (Figura 1, também ilustrada na seção de fotos na Revista Batata Show de março de 2008). Eram as características encontradas em amostras independentes  de tubérculos enviados à Embrapa Hortaliças, por Pedro
Hayashi, de Vargem Grande do Sul (SP), e Valdir Reccanello, de Guarapuava (PR). Aparentemente, não há correspondência entre a presença de lesões nos tubérculos e qualquer sintoma na folhagem. E no momento não se tem idéia da dimensão do problema, levando em consideração de que o descarte nas lavadeiras é a somatória de tudo que é rejeitado. A primeira suspeita da causa da “trilha” foi de ataque de inseto minador, que foi descartada após análise em laboratório de entomologia da Embrapa Hortaliças, quando larvas ou fezes destas  não foram encontradas nas minas de
diferentes dimensões. A segunda suspeita foi de uma manifestação distinta dos sintomas de vírus PVY NTN, que provoca necrose em forma de anéis. Esta também foi rechaçada,  ao se obter plantas e tubérculosassintomáticos, quando tubérculos foram plantados em vasos contendo solo esterilizado. A terceira suspeita foi de que as “trilhas” seriam lesões de Pectobacterium (Erwinia) iniciadas nas lenticelas ou gemas ainda no campo, sob alta umidade do solo, e paralisadas assim que os tubérculos foram expostos a condição seca  após a colheita. Esta hipótese perdeu onsistência ao não se isolar a bactéria (ou qualquer outro patógeno cultivável em meio de cultura artifi cial) dos tecidos afetados e pelo fato de a lesão não se desenvolver quando os tubérculos foram mantidos em câmara úmida.
Além disso, não há explicação plausível para a lesão se desenvolver em forma de “trilha” e não em profundidade. A quarta suspeita, da associação dos sintomas com a presença de nematóides, foi também desconsiderada após análise nos laboratórios da Embrapa Hortaliças e da UNESP Jaboticabal. Descartadas essas hipóteses, resta a possibilidade da “trilha” ser de origem fi siológica, causada por fatores físicos ou químicos do solo. Dentre eles, o contato dos tubérculos com resíduos de herbicidas ou adubos químicos podem provocar danos em maior ou menor extensão, de acordo com o tamanho do tubérculo por ocasião do contato. O formato da lesão, não é explicado de forma adequada. Pelas amostras analisadas, pode-se afi rmar que, qualquer que seja o causador dos sintomas, a trilha atua sobre todas as variedades cultivadas (até o momento), provavelmente não havendo variabilidade genética que possa ser explorada para o controle desse distúrbio.



As verdadeiras causas da ocorrência da “trilha” ainda não foram descobertas



Outras hipóteses poderão existir para esclarecer a etiologia da “trilha”, ou qualquer dessas acima poderá ser contestada ou fortalecida a partir da observação local de produtor ou especialista em fi tossanidade. A mensagem é a da conjunção de esforços, desejada para a solução deste ou outros problemas emergentes da cultura da batata. Certamente novos desafi os se apresentarão a curto e médio prazos. No caso da “trilha”, a comunicação de qualquer informação sobre o assunto poderá ser feita aos autores ou por intermédio da ABBA, em sua página web ou na revista Batata Show.


Carlos A. Lopes
Embrapa Hortaliças,
C.P. 218, CEP 70359-970, Brasília (DF)
clopes@cnph.embrapa.br
Pedro Hayashi
Rua Minas Gerais 430,
CEP 13880-000, Vargem Grande do Sul (SP)
jarril@uol.com.br
Valdir Reccanello,
Zeagro Comercial Agrícola LTDA,
Rua Benjamim Constant, 2121
CEP 85035-260, Guarapuava (PR)
vreccanello@gmail.com

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