Irrigar bem. Um dos segredos para reduzir doenças e aumentar o lucro do bataticultor.

Waldir A. Marouelli
Pesquisador da Embrapa Hortaliças
waldir@cnph.embrapa.br


Introdução
A planta de batata é altamente sensível ao déficit hídrico. Mesmo pequenos períodos de estiagem podem ser prejudiciais à cultura. O rendimento também pode ser seriamente afetado pelo excesso de água, que reduz a aeração do solo, provoca a lixiviação de nutrientes e aumenta a incidência de doenças.


Com exceção dos estados da região Sul, o cultivo da batata é todo realizado sob irrigação. Todavia, a área irrigada nesses estados vem crescendo, devido ao aumento de produtividade e ao menor risco de produção. Adicionalmente, a qualidade dos tubérculos colhidos sob irrigação é superior em tamanho e aspecto visual.


A irrigação da batata é realizada pelos sistemas por aspersão. A irrigação por sulco é muito pouco utilizada no Brasil, pois requer solos sistematizados e pouco permeáveis, enquanto que a limitação para o uso do gotejamento é seu alto custo. A aspersão convencional é o sistema mais utilizado nos estados de São Paulo e da região Sul, enquanto o pivô central é empregado em grandes áreas na região do Cerrado. O sistema autopropelido tem sido adotado especialmente por produtores do Paraná.


Um dos principais problemas da aspersão é a interferência no controle fitossanitário. Além de promover a lavagem dos agrotóxicos, proporciona condições de alta umidade no dossel vegetal, favorecendo a incidência de doenças. Para minimizar tais problemas, as irrigações devem ser realizadas no momento oportuno e na dose certa. Associação da Irrigação com Doenças Plantas submetidas a estresse hídrico (falta ou excesso de água) são mais susceptíveis a doenças e pragas. Embora a água tenha grande influência na quantidade de doenças fúngicas, bacterianas e fisiológicas, a maioria dos agricultores irriga suas lavouras de forma inadequada, geralmente em excesso. Irrigações em excesso, especialmente em solos com problema de drenagem, favorecem várias doenças de solo, como: rizoctoniose (Rhizoctonia solani), murcha-bacteriana (Ralstonia solanacearum), sarna-prateada (Helminthosporium solani), sarna-pulverulenta (Spongospora subterranea), canela-preta e podridão-mole (Erwinia spp.).
Durante o estádio inicial, o excesso de água promove condições de anaerobiose no solo, favorecendo o ataque de Erwinia spp. Já a falta de água retarda a emergência, deixando os brotos mais tempo expostos ao ataque de patógenos menos exigentes em água, como a Rhizoctonia solani. Especialmente no início da tuberização, a deficiência de água favorece a sarna-comum (Streptomyces spp.), comprometendo a qualidade dos tubérculos.


A aspersão, especialmente quando em alta frequência durante o estádio de formação da produção, favorece elevada umidade no interior do dossel vegetativo, aumentando a incidência de doenças da parte aérea, como a requeima (Phytophthora infestans) e a pinta-preta (Alternaria solani). Para minimizar tais problemas, as irrigações devem ser realizadas pela manhã ou início da tarde, de forma a evitar longos períodos de molhamento foliar. A aspersão, por outro lado, minimiza o crescimento populacional de traça-comum (Phtorimaea operculella), bem como a incidência de insetos vetores de viroses, como pulgões.
Pontos de encharcamento nos campos de produção muitas vezes se transformam em focos de disseminação e multiplicação de algumas doenças de solo. Isso pode ocorrer devido a problemas de vazamento em tubulações, baixa uniformidade de distribuição de água, drenagem deficiente e depressões no solo, bem como áreas compactadas por máquinas e implementos. A disseminação de doenças na lavoura também pode ter a água de irrigação como veículo. Fontes de água podem receber água de escoamento superficial de lavouras doentes. Assim, conhecer a origem e a qualidade da água é importante para minimizar tais riscos.


Vários distúrbios fisiológicos de tubérculos podem ser provocados por condições de estresse hídrico que afetam o metabolismo da planta. Todavia, as cultivares apresentam comportamento diferenciado quanto à susceptibilidade a tais distúrbios. Assim, cultivares tolerantes podem não apresentar certos distúrbios, mesmo sob condições extremas de estresse hídrico.


Batatas irrigadas em excesso, principalmente durante o estádio de estolonização / tuberização, são mais susceptíveis a ocorrência de coração-oco, principalmente em cultivares de tubérculos muito grandes, e de coração-preto. Em contraste, a deficiência de água durante o crescimento inicial do tubérculo pode provocar aumento do teor de açúcar na parte basal do tubérculo, inviabilizando seu uso para fritura.
O desbalanço hídrico durante o estádio de formação da produção pode causar, em algumas cultivares, embonecamento e rachaduras de tubérculos. O desbalanço hídrico pode ainda favorecer distúrbios conhecidos como unhadura e coração-oco.


Condições de deficit ou excesso de água próximo à colheita podem também comprometer a qualidade da batata. Tubérculos colhidos com algum grau de desidratação são mais susceptíveis a problemas de esfoladura. Ademais, a antecipação da data da última irrigação além do recomendado pode favorecer o ataque de traça-comum aos tubérculos. Assim, em solos que ao secarem haja formação de pequenas galerias ou rachaduras, as irrigações devem ser realizadas até mais próximo à colheita (1 a 3 dias). Por outro lado, batatas colhidas em solos com excesso de umidade são mais sujeitas a unhadura e podem apresentar lenticelas muito desenvolvidas, desvalorizando o produto e favorecendo a penetração de patógenos, como de Erwinia spp. O sistema radicular superficial e pouco ramificado e da sensível redução do transporte de fotoassimilados das folhas para as raízes, mesmo sob condições de deficit hídrico moderado. Muito embora o baixo rendimento esteja frequentemente associado a irrigações deficitárias, excesso de água também é prejudicial, devendo ser evitados solos com drenagem deficiente.
A necessidade de água da batateira é dependente das condições climáticas, da cultivar e do sistema de cultivo, variando de 250 a 550 mm. Para cultivares mais exigentes, de ciclo longo ou em regiões de alta demanda evaporativa, a evapotranspiração pode superar 600 mm.


A duração do ciclo fenológico varia de 85 a 120 dias, dependendo da cultivar, práticas culturais e condições ambientais. No caso de batata-semente, pode ser inferior a 85 dias. Para fins de requerimento hídrico, este pode ser dividido em cinco estádios: inicial (I); vegetativo (II); estolonização/tuberização (III); formação da produção (IV); maturação (V).


Estádio Inicial (I)
Vai do plantio da batata-semente brotada até a emergência das hastes (7 a 10 dias), sendo mínima a necessidade de água. O coeficiente de cultura (Kc) varia entre 0,45 e 0,55, mas sob irrigações diárias, utilizar Kc de 1,00, e a cada dois dias, Kc de 0,80.


O excesso de água pode reduzir a aeração solo, prejudicando a respiração dos tubérculos e levando a batata-semente a um estresse matabólico. Já a deficiência pode provocar a queima de brotos, retardar a emergência e acarretar falhas de estande. Assim, é recomendado que o plantio seja realizado em solo previamente irrigado (úmido, mas não encharcado) e que se evite irrigações adicionais até a emergência. No caso de solos arenosos e/ ou condições de alta evaporação, pode ser necessário uma a duas irrigações no período. Se a umidade inicial do solo não for satisfatória, deve-se promover uma irrigação, entre 1 e 3 dias antes do plantio, respectivamente para solos arenosos e argilosos, suficiente para elevar a umidade próxima à capacidade de campo na camada de 30 cm. Para solo seco, sugere-se uma lâmina entre 15 mm, para textura grossa, e 40 mm, para textura fina.


Estádio Vegetativo (II)
Vai da emergência das hastes até o aparecimento dos estolões (15 a 20 dias). À medida que a parte aérea se desenvolve aumenta a demanda hídrica (Kc entre 0,45 e 0,55). A deficiência moderada de água pode limitar o crescimento da planta, mas não chega a comprometer a produção caso as irrigações sejam adequadas nos estádios seguintes. Sendo o sistema radicular ainda superficial (10 a 20 cm) e a ETc cerca de 50% da que se verifica no estádio de formação da produção, as irrigações devem ser frequentes e em pequena quantidade. O turno de rega é altamente dependente do tipo de solo e condições climáticas, variando entre 3 e 10 dias (valor menor para solos arenosos e/ou clima quente e seco).


Estádio de Estolonização e Tuberização (III)
Vai do início da formação dos estolões até o crescimento inicial dos tubérculos (15 a 20 dias), sendo o estádio mais crítico à deficiência hídrica (Kc entre 0,75 a 0,85). A falta de água, principalmente no início da tuberização, reduz o número de tubérculos por planta. Em cultivares com tendência à formação de muitos tubérculos, condições de alta umidade podem aumentar o número de tubérculos por planta, diminuindo o tamanho. Assim, para produção de batata-semente é recomendável manter condições favoráveis de água no solo visando maximizar a tuberização. Em termos médios, o turno de rega varia entre 3 e 7 dias, sendo o maior para solos mais argilosos e/ou climas mais amenos.



Estádio de Formação da Produção (IV)
Vai do início da tuberização até o início da senescência das plantas (40 a 55 dias), sendo caracterizado pelo rápido crescimento da parte aérea e acúmulo de fotossintados nos tubérculos.
É um estádio onde as plantas são sensíveis à deficiência de água e requerem mais água (Kc entre 1,00 a 1,10). Condições ideais de umidade favorecem tubérculos maiores, maior teor de amido, melhor qualidade culinária e conservação. Como regra geral, deve-se irrigar a cada 3 a 7 dias, sendo o menor para solo arenoso e/ou alta demanda evaporativa. A estratégia para a obtenção de batatas graúdas é fornecer quantidades moderadas de água no início da tuberização, visando otimizar o número de tubérculos por plantas, e a partir de então aplicar quantidades suficientes para maximizar o crescimento dos tubérculos.



Estádio de Senescência (V)
Vai do início da senescência das plantas até a colheita (10 a 15 dias), sendo o estádio mais tolerante ao défice hídrico. Devido à perda da folhagem das plantas ocorre uma redução da ETc (Kc entre 0,65 e 0,70). Como regra geral, o turno de rega varia entre 3 e 10 dias. Solo muito seco ou úmido pode dificultar a colheita e prejudicar a qualidade e conservação póscolheita dos tubérculos. A época ideal da última irrigação depende principalmente do tipo de solo e da evapotranspiração. A título de sugestão, para solos de textura grossa paralisar entre 3 e 5 dias antes da colheita e para solos de textura fina entre 7 e 10 dias, sendo o menor para evapotranspiração de referência (ETo) acima de 5 mm/dia.



Manejo da Irrigação
As irrigações da batateira são realizadas, via de regra, de forma empírica, apenas com base no senso prático. Mesmo sendo as irrigações realizadas, geralmente, em excesso, as plantas são muitas vezes submetidas a condições de défice hídrico. É também comum se observar sistemas de irrigação com baixa uniformidade de distribuição de água sendo utilizados, resultados de dimensionamento e/ ou manutenção inadequada do sistema. Assim, é possível aumentar a produtividade em até 20% e reduzir a lâmina total de água aplicada em até 30%, por meio do controle eficiente da irrigação.
Vários são os métodos para o manejo da irrigação. Os que permitem um melhor controle da irrigação são aqueles realizados em tempo real, utilizando sensores para a medição do status da água no solo e/ou estimativa da evapotranspiração. O custo, de reposição de água ao solo (f) varia de 0,30 a 0,50, sendo o menor para os estádios mais sensíveis, o que significa deixar a planta consumir de 30 a 50% da água disponível do solo.



A tolerância ao estresse hídrico pode variar entre cultivares; todavia, não se dispõe de informações seguras sobre tensões ótimas para diferentes cultivares. Sabe-se, por exemplo, que a cultivar Ãgata é mais sensível ao estresse hídrico que a Jaette-Bintje, e que a Monalisa apresenta sensibilidade intermediária.
O tensiômetro é um dos sensores mais utilizados, em todo o mundo, para monitorar a tensão em campos de batata. Também podem ser utilizados para a determinação indireta da tensão sensores capacitivos ou de resistência elétrica. O sensor IrrigasÃ’, desenvolvido pela Embrapa Hortaliças, apresenta custo reduzido e baixa manutenção, é de fácil utilização e está disponível para as tensões de 10, 25 e 45 kPa. Os sensores devem ser instalados na linha de plantio entre 10 e 15 cm da planta.



Métodos com Base em Medidas Climáticas A quantidade de água a ser aplicada por irrigação é determinada pelo somatório da ETc (ETc = Kc x ETo) entre irrigações, enquanto o momento de se irrigar pode ser definido pelo balanço de água no solo, com base em informações da capacidade de retenção de água pelo solo, ou adotando-se um turno de rega fixo para cada estádio. O balanço de água pode ser realizado por meio de planilha eletrônica ou programa de computador disponível no mercado. Para o manejo da irrigação em tempo real, a ETo pode ser determinada a partir de equações, como a de Penman-Monteith (padrão FAO), ou do tanque classe A.



Método Simplificado com Base na Evapotranspiração Histórica
Um procedimento mais simples que os anteriores e que não requer o uso de equipamentos é o estabelecimento antecipado do calendário de irrigação, ou seja, do turno de rega e da lâmina de irrigação necessária para cada estádio. Por utilizar dados históricos de evapotranspiração, é menos preciso que os anteriormente.


O livro “Irrigação por aspersão de hortaliças”, publicado pela Embrapa Hortaliças, traz tabelas que permitem estimar o turno de rega e a ETc para os diferentes estádios da batateira, a partir do tipo de solo, profundidade de raiz e dados históricos de temperatura e umidade relativa do ar.
 
 

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