Nova Espécie de Sarna Comum

Streptomyces brasiliscabiei, uma nova espécie causando sarna da batata no Brasil

Suzete Ap. Lanza Destéfano, Lucas Vitor e Daniele B. A. Corrêa. Laboratório de Bacteriologia Vegetal, CAPSA/Instituto Biológico. Alameda dos Vidoeiros, no. 1097, Bairro Gramado, CEP 13101-680, Campinas, SP

A sarna da batata, causada por bactérias fitopatogênicas do gênero Streptomyces, é uma doença complexa de ocorrência generalizada nas principais regiões produtoras do Brasil e do mundo, sendo considerada uma das mais importantes que afetam a cultura. A doença afeta as partes subterrâneas da planta, principalmente os tubérculos e apresenta uma diversidade de sintomas que incluem sarna superficial, reticulada, erumpente ou profunda (Figura 1). Um fator importante a ser considerado no patossistema é que a incidência e a severidade da doença variam de acordo com a espécie causadora, o grau de virulência associado à essa espécie, o ambiente em que ela está estabelecida e a suscetibilidade da cultivar plantada.

Figura 1. Diferentes tipos de lesões de sarna nos tubérculos de batata causadas por Streptomyces sp. (A) superficial, (B) reticulada, (C) erumpente e (D) profunda.

O grupo de pesquisa do Laboratório de Bacteriologia Vegetal (LBV) do Centro Avançado de Pesquisa em Proteção de Plantas e Saúde Animal (CAPSA) do Instituto Biológico, em parceria com a Associação Brasileira da Batata (ABBA), realizou um estudo de levantamento de espécies do gênero Streptomyces que causam a sarna da batata nos campos de produção do Brasil. Os trabalhos realizados no decorrer dos anos resultaram em seis Dissertações de Mestrado e uma Tese de Doutorado, sendo essa última responsável por experimentos que comprovaram a existência de dezenas de possíveis novas espécies de Streptomyces.

A primeira espécie a ser descrita no Brasil foi denominada de Streptomyces brasiliscabiei, com características morfológicas, fisiológicas e bioquímicas muito semelhantes à espécie mais amplamente distribuída no globo, S. scabiei, porém com características genéticas bem distintas (Corrêa et al., 2021). O trabalho envolveu um estudo de taxonomia polifásica de seis linhagens de Streptomyces isoladas de tubérculos de batata provenientes de regiões produtoras do Estado de Santa Catarina (3 linhagens da cidade de Irineópolis e 3 de Canoinhas) consideradas como uma nova espécie de Streptomyces associada à doença no país.

Os resultados da caracterização morfológica mostraram coloração dos esporos marrom-acinzentada (Figura 2A), micélio aéreo com hifas em forma espiral (Figura 2B), cadeia de esporos com superfície lisa (Figura 2C) e produção de pigmento escuro difusível em meio de cultivo.

Figura 2. Características morfológicas de Streptomyces brasiliscabiei. (A) Coloração dos esporos, Morfologia da cadeia de esporos (B) Microscópio Óptico; (C) Microscopia Eletrônica de Varredura.

Na caracterização bioquímica as linhagens analisadas utilizaram todos os açúcares do ISP (International Project of Streptomyces), foram capazes de crescer nas seguintes condições: temperaturas entre 20 e 32 °C, sendo a temperatura ótima de 28 °C; pH 4 a 12, sendo o pH 7 o ideal; concentrações de NaCl até 6%. Ainda, apresentaram resposta positiva para hidrólise de amido.

A confirmação da patogenicidade dessa nova espécie foi fundamentada em três metodologias diferentes:

1) amplificação positiva dos genes da ilha de patogenicidade PAI – Pathogenicity Island) operon txtAB (taxtomina), tomA (tomatinase) e nec1 (proteína necrogênica);

2) testes in vitro, utilizando sementes de rabanete e corte de discos de batata (Figura 3), considerados testes com alta sensibilidade e especificidade respectivamente;

3) testes in vivo, em casa de vegetação, onde o tubérculo de batata semente foi plantado em substrato inoculado com o patógeno para reprodução dos sintomas inicialmente observados (Figura 4).

Figura 3. Teste de patogenicidade em fatias de minitubérculos (in vitro). (A) Controle negativo; (B) Linhagem patogênica IBSBF 2867T.

 

Figura 4. Teste de patogenicidade in vivo (casa de vegetação).

Os testes moleculares envolveram a análise do gene 16S RNA ribossomal, a análise de multilocus empregando os genes atpD, gyrB, recA, rpoB e trpB de várias espécies de Streptomyces causadoras da sarna da batata e os resultados das análises confirmaram a existência de nova espécie de Streptomyces ocorrendo no Brasil (Figura 5).

A linhagem Tipo de S. brasiliscabiei foi depositada nas seguintes Coleções de Culturas: IBSBF – Coleção de Culturas de Fitobactérias do Instituto Biológico, Campinas, SP, Brasil (IBSBF 2867T), Coleção Brasileira de Micro-organismos de Ambiente e Indústria, Campinas, SP, Brasil (CBMAI 2394T) e International Collection of Microorganisms from Plants, Auckland, Nova Zelândia (ICMP 23759T). O trabalho em sua íntegra pode ser acessado em https://link.springer.com/article/10.1007/s10482-021-01566-y

  Considerando que a sarna da batata é causada por diferentes espécies de Streptomyces, a identificação do agente causal torna-se de extrema importância para o desenvolvimento de novas estratégias de manejo da doença.

Figura 5. Árvore Filogenética construída a partir de sequências concatenadas dos genes atpD, gyrB, recA, rpoB e trpB das linhagens de Streptomyces spp., causadoras da sarna da batata, utilizando-se o método Neighbor-joining. A sequência de Streptomyces flavidofuscus foi utilizada como grupo externo. Os números em cada um dos ramos são as porcentagens de ocorrência dos agrupamentos com base nas análises de bootstrap de 1000 repetições. A barra indica 2% de diferença nas sequências.

Agradecimentos

Agradecemos à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo apoio ao projeto (Processo no. 2007/52530-2) e bolsa para D.B.A. Corrêa (Processo no. 2011/02994-8); e à Associação Brasileira da Batata (ABBA) pelo suporte financeiro e fornecimento de tubérculos de batata infectados provenientes de diferentes regiões produtoras do país.

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