Valor de Cultivo e Uso de Cultivar de Batata

José Amauri Buso Pesquisador Ph.D. Embrapa Hortaliças email: buso@cnph.embrapa.br. CP 218 – CEP:70.338-970-Brasilia, DF.


Uma das exigências para a comercialização de batata-semente de uma nova cultivar de batata no país é estar inscrita no Registro Nacional de Cultivares- RNC, conforme estabelecido em Portaria do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, em 1998 (Portaria no. 294). O registro de cultivares no Brasil é atribuição do Serviço Nacional de Proteção de Cultivares- SNPC, que coordena e administra o Registro Nacional de Cultivares- RNC, edita as normas para os ensaios de Valor de Cultivo e Uso (VCU), inspeciona a execução dos ensaios de VCU, analisa os requerimentos dos interessados em registrar novas cultivares, delibera sobre a inscrição de uma nova cultivar e edita e mantém a Listagem Nacional de Cultivares Registradas no país. Para o registro há necessidade de se dispor de informações sobre o comportamento da cultivar nas condições ambientais do país.


Estas informações constituem-se no que é denominado de Valor de Cultivo e Uso (VCU) de uma cultivar. O VCU é determinado em ensaios específicos, conduzidos pelo próprio interessado/ responsável pela cultivar no país, ou por terceiros em seu nome, sob contrato. Estes ensaios devem obedecer a critérios mínimos na condução dos mesmos, estabelecidos por um grupo de especialistas na cultura, e indicados na Portaria citada acima. Todas as informações sobre como determinar VCU em batata estão disponíveis no site www.agricultura.gov.br/snpc. A importância do VCU está em que os produtores vão dispor de informações biológicas sobre o comportamento da nova cultivar nas condições brasileiras, e estas vão auxiliá-los na tomada de decisão da escolha de uma nova cultivar. O registro de cultivares foi instituído com a finalidade de se disciplinar a venda de batata-semente de novas cultivares no país, permitindo a comercialização apenas para as que tenham sido testadas , com a coleta de informações sobre seu comportamento nas condições ambientais do país. A responsabilidade no estabelecimento do VCU é da empresa interessada em comercializar a nova cultivar estrangeira no Brasil ou da instituição brasileira responsável pelo desenvolvimento e liberação da nova cultivar no país. A nova cultivar é considerada como um produto, e este produto deve ter suas características descritas , para as condições ambientais do país, pelo obtentor ou introdutor no Brasil. Portanto, todas as novas cultivares de batata devem ter o respectivo VCU estabelecido para fins de registro. Como boa parte das novas cultivares oferecidas no mercado brasileiro são desenvolvidas em outras condições ambientais, é necessário se estabelecer o compor amento das mesmas quando cultivadas no Brasil. Um relatório técnico deverá ser elaborado pelo requerente e entregue ao Serviço Nacional de Proteção de cultivares (SNPC) ao se efetuar o registro no MAPA. Este relatório contém informações divididas em quatro grupos : 1- dados de produtividade, 2- comportamento ou reação às principais pragas e doenças, 3- região de adaptação e 4- outros dados que justifiquem a sua importância para o mercado nacional. Para a batata, são necessárias a coleta das seguintes informações: 1- a origem da cultivar, com indicação da instituição criadora, 2- a genealogia ( clones ou cultivares utilizados como genitores) da mesma, 3- os locais de avaliação da nova cultivar e das cultivares padrões, 4- os descritores botânicos da nova cultivar, em caso de não estar ainda protegida no Brasil (Estes descritores são similares aos exigidos para a proteção de uma nova cultivar no país, denominados descritores mínimos), 5- a região de adaptação, e 6- as características agronômicas e de uso. Os descritores botânicos considerados são: formato do broto, coloração da base do broto, pubescência da base do broto, pigmentação da haste da planta, tamanho do broto, presença de ondulação das bordas dos folíolos, coloração da parte interna da corola das inflorescências, ciclo vegetativo, formato dos tubérculos, cor da película e da polpa dos tubérculos. Para o item região de adaptação deverão ser presentados os indicadores de adaptação em relação a altitude, latitude, época de plantio e/ou outros fatores bióticos / abióticos , a critério do responsável pelo ensaio/ requerente. Para o item caract rísticas agronômicas e de uso devem ser informadas as seguintes características: porcentagem de matéria seca dos tubérculos, avaliado indiretamente pelo peso específico de amostra de 50 tubérculos (característica associada à qualidade culinária da batata), a incidência de ocorrência de defeitos fisiológicos (expresso em porcentagem de ocorrência por tipo de defeito (crescimento secundário, embonecamento, rachaduras, mancha ferruginosa, mancha chocolate e ocamento), e a incidência das doenças principais, bacterianas , viróticas e fúngicas. As características peso específico, e ocorrência de defeitos fisiológicos devem ser avaliadas em comparação às duas cultivares mais importantes no local e época de plantio do ensaio. Os ensaios para coleta de dados devem ser conduzidos em no mínimo seis ambientes, sendo estes obtidos pela combinação de épocas de plantio (ou safras), e locais. Portanto, dever-se-á conduzir os ensaios em dois locais e três épocas de plantio, ou três locais e duas épocas de plantio. Os locais devem ser escolhidos em regiões edafoclimáticas de importância para a cultura.


A necessidade de se repetir os ensaios em diferentes ambientes é que cultivares de batata podem apresentar interações (comportamento diferencial) dependendo do ambiente onde estão sendo cultivadas. Com as repetições, minimizam-se os efeitos dessas variações devido a essa interação, obtendo-se valores médios. Outras características desses ensaios são: tamanho de parcela não menor que 100 plantas da cultivar em avaliação, com no mínimo duas repetições por ambiente. As características agronômicas devem ser comparadas com pelo menos duas cultivares importantes regionalmente e que estejam entre as cultivares registradas no Brasil. Estas comparações são importantes pois permitem uma melhor escolha ou avaliação do potencial da nova cultivar quando comparada nas mesmas condições com cultivares já conhecidas pelos produtores. Para doenças, as novas cultivares devem apresentar informações sobre a reação das mesmas para as seguintes : 1- doenças fúngicas- a requeima, causada por P. infestans, a pinta preta, causada por A. solani e a rizoctoniose, causada por Rhizoctonia solani; 2- doenças viróticas- devem ser consideradas as doenças causadas pelo vírus do enrolamento da folha da batata (PLRV) e pelo vírus Y da batata (PVY); 3- doença bacteriana é considerada a causada por Erwinia . Na avaliação para a reação da resistência à requeima da nova cultivar em teste, deve ser utilizada conjuntamente uma cultivar considerada resistente (deverá ser escolhidas uma das seguintes cultivares Itararé, Araucária, Monte Bonito, Catucha ou Cristal), e uma sucetível (Bintje, Mondial, Agria ou Atlantic). Para pinta preta também deve ser utilizada uma cultivar resistente (Aracy, Cristal, Panda, Monte Bonito ou Araucária) e uma suscetível (Achat ou Bintje).


Quanto à produção de batata-semente da nova cultivar, deverão ser informados o estoque disponível por ocasião do registro e a classe da mesma, bem como o ano de início da comercialização no país.


Informações complementares são requeridas e referem-se ao sistema de produção sugerido para a cultivar e as limitações da mesma, i.e., as condições de cultivo e uso que devem ser evitadas para a nova cultivar. O Valor de Cultivo e Uso pode ser estabelecido pelo próprio requerente do registro, ou também por uma instituição pública ou privada de Pesquisa e Desenvolvimento, sob contrato ou convênio, para a empresa interessada. O MAPA deve ser informado, via relatório técnico, do nome da instituição, e do técnico que realizou os ensaios. Esta possibilidade representa uma excelente oportunidade para uma melhor interação do setor importador ou obtentor de cultivares de batata no país e instituições públicas e privadas de P&D, aumentando- se a capacidade instalada de técnicos aptos e interessados na avaliação de novas cultivares de batata no país. Além do relatório técnico, há necessidade da apresentação dos dados experimentais que justifiquem a inscrição da nova cultivar no RNC.


Para inscrição no RNC a nova cultivar deverá apresentar pelo menos uma vantagem em relação a uma das cultivares testemunhas, considerando-se os critérios produtividade, reação a doenças e/ou características tecnológicas. Com isto, cultivares que não apresentam superioridade em pelo menos um aspecto considerado, serão descartadas. Novas informações sobre a mesma cultivar, como adaptação a novas regiões, reação a outras pragas ou doenças ou outras qualidades ou limitações, poderão ser adicionadas ao VCU quando estas informações estiverem disponíveis. O estabelecimento de VCU deve ser considerado um processo dinâmico e contínuo de coleta e tratamento de informações sobre a cultivar. Com várias áreas e épocas de produção no país, esta abertura de incorporação de novas informações ao VCU abre a possibilidade do interessado em ” trabalhar o mercado” da nova cultivar , fazendo trabalhos intensos de marketing em uma região produtora, e posteriormente, em uma segunda fase, cobrir outra região. Caso a cultivar não apresente atrativos aos produtores de uma região representativa da bataticultura nacional, não haverá motivos para se investir em atividades de marketing em outras regiões. O RNC representa para os produtores mais uma ferramenta importantíssima para a tomada de decisão sobre o plantio de novas cultivares de batata.


Com o fornecimento de informações sobre o comportamento da cultivar de interesse nas condições brasileiras, os representantes de empresas de desenvolvimento genético de batata, nacionais ou externos, aumentam a transparência no relacionamento comercial com os produtores- a nova cultivar como um produto bem caracterizado. Os produtores ainda tem a Lei de Defesa do Consumidor, que poderá ser acionada caso se sintam lesados por informações inverídicas ou incompletas. Na elaboração da primeira lista de cultivares para registro, o SNPC levantou todas as cultivares que eram cultivadas no país, as que tinham sido desenvolvidas até então no país, ou as aprovadas nos antigos Ensaios Nacionais de Cultivares de Batata, à época coordenados pela Embrapa. Desde então, já foram registradas 64 cultivares, sendo 16 nacionais (tabela 1). Já há profissionais de agronomia no mercado trabalhando no estabelecimento de VCUs de várias cultivares que já foram protegidas no país. É necessário esclarecer que o processo de proteção de uma nova cultivar não está relacionado com o de registro. Uma cultivar no país poderá estar enquadrada em uma das três situações seguintes : protegida e registrada, protegida e não registrada, não protegida e registrada. No futuro próximo espera-se um aumento substancial na lista de cultivares registradas , pois apenas a proteção da cultivar não a habilita a ter batata-semente produzida e comercializada no país.


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